Organizador e Comentador: Paulo Monteiro dos Santos[1]
RABO BRANCO
Atenção,
Em verso vou publicá
A história d’um gato
Que come sem lhe custá.
Só o gato engordano
E os morado clamado
Sem ter jeito para dá.
Da Vazea de Cima ao Raso Limpo,
Da Serrote, a Carnaíba,
Esse gato passeava,
Procurando a comida.
A custa dos criador,
Pra ele nunca faltou
Com que encher a barriga.
Lourival sempre clamava
E falou a muita gente,
Mate esse gato danado
Que não tem quem aguente,
Procure um caçador
Que esse gato comedor
Vai acabar a semente.
Pode fazer uma bolsa
Que eu garanto ajudar
Dou uma ovelha boa
Ao caçador que matar
Esse gato perigoso
Que já estou desgostoso
Não adianta criar.
Nininho de Zé Paulinho
Com ele se encontrou
Em cima de uma carniça
O gato lhe enfrentou
Com uma espingarda-francês4,
Bateu o crefe5 duas vez
E o gato desabou.
Nininho e Ovídio
À noite foram caçar
Depois que andaram um pouco
Viram os cachorros acuar
Chegaram era Rabo Branco
Nininho muito franco
Subiu logo pra laçar.
Quando foram chegando perto
O gato se arrepiou
Descendo de erva baixo
Com ele se encontrou
Querendo lhe estrangular,
Nininho pra se livrar
Botou o facho6 e queimou.
Botou o facho na cara
O gato pulou de um lado
Nininho desceu em baixou
Bastantemente assombrado
Dizendo para Ovídio:
“Já viu que gato atrevido?
Me vi um pouco apertado.”
Nessonha a Dé Pereira
Vieram para rastejar
Com dois cachorros de fama
Que só queriam botar
Soltaram na bagaceira
Não viram nem a poeira
Rabo Branco ficou lá.
Ainda botaram um dia
Ele com a barriga cheia
Espantaram da carniça,
Tinha matado uma ovelha
Disseram: “ Hoje tu morre!
Gato pesado não corre,
Agora tu se areia7.”
Ficaram gritando
Arribando os cachorros
Gato estava apertado
Que só um pinto no ovo.
Pra história se encurtar
Em vez do gato se área,
Ele foi que areou os cachorros.
Ficaram desanimados
Porque não viram vantagem,
Rabo Branco quando sai
No chão só deixa raspagem.
“Só morro quando Deus quiser!
Nessonha e Sinhô André
Não vem me caçar mais”.
Eu estou aqui morando
Nuns terrenos de areia,
Ando pra cima e pra baixo
Pisando na mesma aldeia.
Quem tiver cachorro ruim
Não ponha atrás de mim
Eu quero é comer ovelha.
Durval Dantas Pereira
É um homem muito animado,
Quando fala neste gato
Ele dá seu resultado.
Dizendo perante o povo:
“Se meu cavalo fosse novo
Eu ia pegar enrabado8.”
Edelsom mais Edelfonso
Ainda foram uma semana
Para matar Rabo Branco,
Mas todo mundo se engana,
Em vez do gato eles matar9
Os cachorros foram pegar
Umas cabras da Velha Ana.
Por causa de Rabo Branco
Tudo ta indo na taca10.
“Vamo pro mato caça ele
Com ele ninguém se ata
A miunsa11 se consome
Que as ovelhas o gato come
As cabras os cachorro mata.
Até a velha Ana
Ta esquentando o juízo
Por causa de Rabo Branco
Ta tendo prejuízo:
“Este gato é um horror,
Que lhe falhe os criador
Enquanto ele for vivo.”
A fama de Rabo Branco
Já está um pouco crescida,
Já veio do Creguenhe12
Aqui para a Carnaíba.
Dois caçadores pra esse gato
Passar a semana no mato
A fim de tirar-lhe a vida.
Na casa do Zé do Santo
Eles ficaram arranchados
Com um cachorro velho e feio,
Alem de feio pelado.
No domingo foram ao mato
E lá encontraram o gato,
Voltaram envergonhado.
Bota cachorro pelado
Neste gato não convém,
Rabo Branco é sabido
É mimoso e passa bem.
Veio dá seus passos atoa
Quem tem cabelo não acoa
Quanto mais quem não tem.
O senhor João Batista
É um homem muito ativo,
Trouxe os caçadores de fora
Pra evitar o prejuízo.
Tirar o gato da aldeia
Para ver se as ovelhas
Podiam ter um alívio.
Mas o plano não deu certo,
Porem nada esta valendo.
Os caçadores foram embora
O gato ficou comendo.
O dia dele não chegou
Por isso os criadô
Ainda estão sofrendo.
Sinhozinho Calazansas,
Homem de sorte aplaudida,
Nunca caçou Rabo Branco,
Mas foi quem tirou-lhe a vida.
As ovelhas sossegou,
Sinhozinho foi quem matou
Aquela fera temida.
Ninguém sabe quem é ele
Com aquela macieza,
Sabe onde as cobra dorme
Tem dote da natureza.
Tem cachorro de valor,
Rabo Branco se acabou
Pra ele não teve destreza.
Agora os moradores,
Todos já podem dar
Um agrado a Sinhozinho
Mesmo sem ele cobrar,
Por sua delicadeza,
Em recompensa da defesa
Que ele fez trocar.
LULÚ DE DONA MORENA
Lulú de Dona Morena,
Ele fez uma saída,
Foi passear no pé da serra
Para divertir a vida.
Lá bebeu se embriagou
E nunca mais acertou
Com o caminho da Carnaíba.
Anoiteceu e não chegou
Ficaram em confusão,
Seguiu cinco homens atrás
Procurando informação,
Quem encontrava eles perguntava,
Disseram que já andava
Com pé calçado outro no chão.
Só deus sabe como ele ficou
Quando se viu embriagado,
Não sabia onde estava,
Um pé no chão, outro calçado.
Por causa da pindaíba
O caminho da Carnaíba
Pra ele era fechado.
Ficou desorientado
Saiu andando atoa,
Tomou o caminho do Sítio
Igualmente a quem avoa.
No Sitio não quis ficar,
Resolveu viajar
Foi sair na Lagoa
Ficou pra cima e pra baixo
Querendo fazer guerra
Porque todo mundo sabe
Que os bêbados são os que erra.
Bêbado não tem quem aguente,
Ai voltou novamente
Foi sair no pé da serra.
Andou na Baixa-do-Cabrito13,
Andou na Pedra-da-Ovelha,
Caminhou a noite toda
Fazendo rastro na areia.
Neste dia viu a morte,
Mais ainda teve muita sorte
Que voltou pra sua aldeia.
Não comeu e nem bebe,
Passou a noite com fome.
Não adiantava chamar
Que a bêbado ninguém responde.
Pelo tanto que ele andou
Nesta noite ele virou
O Bicho-lobisomem.
Mas acharam ele bêbado,
Ficaram ajeitando,
Trouxeram ele de volta,
Isso ai foi um bom plano,
Porque se não fosse atrás
Ele não voltava mais
Ainda hoje tava andando.
Mas tudo isso é o signo
Que Deus lhe deu,
A ordem do criador,
Cada qual pra que nasceu.
Das bodegas ele é freguês,
O futuro que ele fez
A cachaça já comeu.
Lulú eu peço desculpa
D’eu isso ter rimado.
Se você buli14 comigo
Eu foi bastante errado.
Você tem toda razão
Mais se queixe de seu irmão
De ele ter me mandado.
Vieram me dizer
Todos os dois de uma vez,
O seu filho e seu irmão
Contando o que você fez
Falaram tudo num dia
Realmente eu não sabia
Desta tua embriagues.
TESTAMENTO DO JUDAS
Hoje eu vou morrer queimado
Só me queixo do prefeito
Trabalhei vinte dois anos
Não recebi meus direitos
Nunca tive proteção
Hoje eu to nesta aflição
E ele não me dá jeito.
Falei também com o Gildásio
Pra vê o que ele fazia,
Porque vou morrer queimado
Vê se ele me defendia.
O que ele veio me dizer:
“Pra mim se você morrer
Eu tenho mais alegria.”
Todos presta a atenção
Porque agora vou fala
Na oferta do povo
Que eu preciso avisar
Porque hoje eu vou morrer
Pra vocês todos saber
O que eu vou deixar.
Pra Niria eu vou deixar
Um emprego de alegria
Pra ela ficar trabalhando
Em casa de família
Pra ela não perder o ganho
Ela só vai tomar banho
De oito em oito dia.
Pra Dadá eu vou deixar
Uma obrigação mais pouca
Pra ela não se flagelar
Se não ela fica louca
E ninguém ta agradecendo
Pra ela pegar por menos
As trouxa pra lavar roupa.
Pra Carminha eu vou deixa
Uma obrigação pesada
Trabalhar em casa de família
Levantar de madrugada
E ela que se afoite
Porque quando for de noite
Ela não aguenta nada.
Pra Ronaldo eu vou deixar
Um emprego animoso
Pra ele ficar andando
Fazendo favor ao povo
É um veterinário animado,
Mas ele só vive melado
De sangue de cachorro.
Pra Ronaldo aqui ficou
Duas quadras nesse romanço15
Que o povo ta comentando
E ficou no meu alcanço
Se você me obedecer
Vou pedir pra você
Deixar de ser corno manco.
Para Sergio o açougueiro,
Para ele eu vou deixar
Pra cortar carne no açougue
Quando o dia se findar
As pelancas que ele tiver
Ele trás pra mulher
E manda ela cozinhar.
Para Mané Tratorista
Para ele eu vou deixar
Uma oferta muito boa
Para de mim se lembrar
Porque isso não me passa
Uma jaqueta e uma tarrafa
Para ele não se molhar.
Para Bel dos Botijões
Vou dar um conselho primeiro
Pra ele entregar a moto
E sair dos cativeiros.
Vá pra roça descansar,
O povo pega pra matar
A formiga nos formigueiros
Para Zé Pequeno
Que tem disposição
É muito interesseiro
Pra ele não tem verão
Pra ele sobreviver
Vou deixar pra ele vender
As caixas de papelão.
Vou deixar para Zé Uiltom,
Pra ele viajar pra o Poço
Uma besta veia magra
Com uma sarna no pescoço.
Não tem cela pra botar
Mas não pode demora
Vai montado mesmo em osso.
Pra Zuzú eu vou deixar
Uma obrigação maneira,
Que o povo da rua pede
Porque ela é ligeira
E não tem corpo enfadado
Pra ela sair dando recado
Porque é caminhadeira.
Para dona Edelina
Que é uma mulher idosa
É muito delicada
E também cheia de prosa
Mais isso não quer dizer nada
Ela vai vender cocada
Pra beber água gostosa.
Vou deixar pra Luciano
Uma mulher que adoro
Escreveu pra minha festa
E pro Luciano eu choro.
Eu hoje vou me acabar
Mas pra ela eu vou deixar
Pra escrever no meu cartório
Agradeço a todo povo
Que veio se apresentar
Aqui na minha festa
Antes d’eu me queimar
Pra todos estou olhando
Somente daqui a um ano
É que torno a voltar.
Findou a festa do Judas
Hoje aqui na praça
Foi uma festa moderna
Porque não teve cachaça
Todo povo consciente
Isso é esforço da gente
Somente pra fazer graça.
Peço desculpas a todos
Se alguém se achou-se agravado
Porque li o ABC do Judas
Mas eu não fui o culpado
Eu vim fazer um favor
Delino foi quem mandou
Eu dar esse resultado.
FUMACINHA
Corria, corria, gritando
Numa toado comprida
Arrasta, arrasta a novilha
Eu quero ver a caída
Vamos bota-la no chão
Enquanto ver a reação
Do efeito da batida.
[...]
Monceis fez muita graça
Rastejando Fumacinha
Quanto o tempo se passa,
Foi na casa da morena
E bebe cinco cachaça.
Depois desta cachaça
Ficou desorientado
Montou no cavalo
Saiu muito avexado
A baixa estava alterada,
Jogou o cavalo n’água
Quase que morre afogado.
O Tota tava longe
Mais ainda percebeu
Que ele estava se afogando
Ligeiramente correu
O Elio chegou primeiro
Tirou seu companheiro
Que por isso não morreu.
Elio de Dona Morena
Este já está aqui
Chegou de São Paulo agora
Veio pra se divertir
Parece que adivinha
Veio correr com Fumacinha
Pra ver fumaça subir.
O senhor Dede de Loura
Ele é um pouco atrevido
Veio de longe campear
Num lugar desconhecido
Com vontade de achar
Fumacinha para pegar
No seu cavalo sabido.
O Domingo do Simão
É um vaqueiro animado
Botou o cavalo nela
E saiu muito avexado
Os outros acompanharam
Mais adiante acharam
Ele num pau enganchado.
Esse perdeu um facão
Mais foi logo sem demora
Comprou outro fiado
Disse: “Eu tenho um facão agora.”
Guardou quando ele saiu
Roubaram do boca-piu16.
É ser muito caipora.
Rastejaram Fumacinha
Durval com seus parentes.
Durval corria gritando
Com seus sobrinhos na frente
Neste dia alcançaram
Fumacinha e derrubaram
No fogo da aguardente.
UMA MOÇA QUE ARRANJOU UM GRANDE AMOR
[...]17
Aqui tem uma moça
Que arrumou um grande amor
Mas com ele não quis caçar
Resolveu terminar
E viajou pra salvador.
E era um rapaz bom
Muito direitinho.
Ela foi pra Salvador
Deixou ele sem carinho.
Foi cumpri uma sina
O nome dela é Carina
O dele Ricardinho.
Mais ela ainda vem
Aqui pra passear
Porque a avó mora aqui
E ela vem visitar.
Eu tenho toda certeza
Que ela ainda deseja
Ver o passado voltar.
Ela arrumou outro homem
E tem um minininho
Mas nunca esqueceu
Dos primeiro carinhos,
Mas ainda tem esperança
Ela achava bom que essa criança
Fosse do Ricardinho.
MINHA HISTÓRIA
Todos prestem a atenção
O que vou dizer agora
Eu sinto uma grande saudade
Que não me sai da memória,
É lembrar os tempos atrás
Porque hoje eu não sou mais
Quem já fui em outrora.
Na profissão de vaqueiro
Corri muito atrás de gado,
Enfrentei lutas pesadas,
Pegava boi, montava bravo.
Hoje já fui operado
Me acho inutilizado
Relembrando o meu passado.
Porque, alem da idade
Surgiu uma operação.
Sinto uma grande saudade
Que me dói no coração
De hoje não fazer mais nada,
Porque a velhice acaba
Do homem a disposição.
O homem na mocidade
Faz tudo que quer fazer
E se obter saúde
Ele tem todo prazer.
Na velhice nada alcança,
Pois só lhe vem na lembrança
Que este perto de morrer.
A mocidade e a saúde
Isso é o prazer do homem,
Enfrenta tudo, batalha,
Sua obrigação responde.
Trabalha forte com gosto
O suor molhando o rosto,
Mas tá honrando o seu nome.
O homem na mocidade
Tem prazer brinca e farreia.
Penetra em tudo com força
Igual ao sangue nas veias.
Digo perante o povo
Lembrando o tempo de novo
A saudade me judêia.
Outras coisas no mundo
Pra mim já terminou,
Honrei minha profissão,
Todos me davam valor (...)
Para mim hoje nada mais influi,
Por eu não ser mais quem fui
Minha alegria acabou.
Isto que estou falando
É uma realidade,
Porque todos nós sente
Quando perde a mocidade.
Hoje estou velho e cansado
Lembrando do meu passado
Quem me maltrata é a saudade.
Nunca poço me esquecer
Desses meus tempos atrás
Enfrentei muito a vida
Tinha bastante coragem,
Hoje só resta a lembrança,
Já se foi minha infância,
Tempo que não volta mais.
PARA MINHA ESPOSA
Genita aqui vai escrito
Uns versos para você
Falando sobre o sertão
Que a vida tem mais prazer
Quem se criou-se por lá
Não adota esse lugar
Pouca gente aqui se vê.
Aqui nas motas18 do sul
O clima é diferente
É um lugar abafado
O ar não comporta a gente.
Eu só tenho alegria
Quando eu voltar um dia
Ao meu sertão florescente.
Genita, muito longe
De você eu me acho
Ficar aqui muito tempo
Para mim é um fracasso.
Com vontade de te ver,
Desejando receber
De você um forte abraço.
Saudade, muita saudade,
Essa é quem não me consola,
Me lembrando de vocês
Pois não me esqueço uma hora.
Saudade dói que só brava,
Meu peito é uma casa
Onde vocês todos mora.
Genita receba a lembrança
De quem nunca te esqueceu
Vivo cheio de saudade
Meu coração pelo teu
Eu sou firme permanente
Seu amor uma semente
Que no meu peito nasceu.
A DANIELA19
A Daniela é boa pessoa
De muita delicadeza
Eu gosto muito dela,
Para mim uma beleza
Ela vai [me]20 bota [na] escola
Porque tem boa memória
Por obra da natureza.
Todo mundo gosta dela
Porque é boa pessoa
Por sua delicadeza
Ela não fica atua,
E isto que estou falando
Porque o povo de Tucano,
Ama está pessoa.
Historiando O Poeta
O poeta José
Arcanjo nasceu na cidade de Tucano no Estado da Bahia, mais especificamente no
povoado da Carnaíba, como confirma ele em entrevista concedida: “Eu
nasci no dia 18 de março de 1928. “[...] Hoje tô com 86
anos. [...] Eu nasci foi na Carnaíba de cima... É um povoado aqui de
Tucano.” (ARCANJO MOURA. Entrevista ao autor. Tucano –BA. 2014 –
CD 1).
Aprendeu a
ler, segundo ele, com 6 anos de idade. Diz o poeta que frequentou a
escola pouco tempo. Perguntado sobre como e quando começou a ler, ele nos
informou o seguinte:
Eu acho que já tava com 6 anos, quando comecei a ler [...]
foi pouco tempo de escola; era na roça a escola [...] a professora era
Altamira, já morreu. Foi pouco tempo de Escola. [...] Aprendi a
ler com esta professora, pouco tempo. E o restante de leitura
foi pedindo aos outros. (ARCANJO MOURA. Entrevista ao autor. Tucano –
BA. 2014 – CD 01)
Sobre este
pouco tempo de escola, é conveniente dizer que naquele tempo, início do século
XX, o processo educacional era bem precário, principalmente nas várias
regiões do país. Talvez por isso seu José Arcanjo não teve muito tempo em
sala de aula para concluir os estudos. Outro fator é que, segundo o
próprio poeta, teve que trabalhar muito cedo, abandonando assim os estudos.
Seu José
Arcanjo trabalhou como vaqueiro até, mais ou menos, aos 65 anos, quando
parou com a profissão por questões de saúde e idade. Mesmo
com a atividade de vaqueiro, que é uma profissão sem local
fixo, morou em poucas regiões, e todas próximas de Tucano.
Em cidades eu só morei nesta, agora em roça, morava
na Carnaíba, na Lagoa do Canto. [...] Eu fui vaqueiro e o Mirante era cidade,
eu morei lá. [...] Morei na Caueira,
na Palmeira do Miranda, e nos Olhos d’Água. [...]” (ARCANJO MOURA.
Entrevista ao autor. Tucano – BA – 2014 – CD 2)
Perguntamos
ao poeta com quantos anos começou a fazer verso, seu José
responde que foi com 8 anos de idade.
Estas coisas, quando eu estava com uns 8
anos, já fazia. Eu já fiz um lote de versos. [...] Para mim lembrar!!!
[...] Deixa ver! [...] Já fiz uns 8 a 20 versos. Tive na escola
Altamira, e depois não tive escola mais não, mas... Agora, fiquei sempre
continuando com a leitura e depois consegui, sem escola sem nada. (ARCANJO
MOURA. Entrevista ao autor. Tucano – BA – 2014 – CD 2)
Coletamos 9
poemas do Sr. José Arcanjo Moura, dentre estes versos, alguns com pouco
menos de 5 a 6 estrofes. Devido à idade avançada do poeta, sua
família informou que ele já não consegue lembrar mais dos versos
que fez.
Tomamos a
liberdade juntamente com o poeta, em dar nomes aos poemas: O primeiro e
mais longo é Rabo Branco: poema que fala sobre as façanhas de
um gato; O segundo é Lulú de
Dona Morena: contando a história de um bêbado da
região; O terceiro é Minha História; O quarto é um poema
que ele dedica para sua esposa, Para minha Esposa; O quinto é
outro poema dedicado a sua neta: Daniela; O sexto é
um pequeno verso falando sobre uma novilha desgarrada: Fumacinha;
O sétimo é um curto poema em que ele conta sobre Uma
moça que arrumou um grande amor; O oitavo é um poema em Homenagem
ao Mandacaru; e o último é um Testamento do Judas, versos
de tradição na semana santa.
Versos Da Cantoria Do Cordel
A
temática predominante na maioria dos versos do Sr. José Arcanjo é a sátira,
não a sátira crítica à sociedade, mas de acontecimentos corriqueiros
no cotidiano de sua região. Como exemplo, tomemos o poema Rabo
Branco (ver anexo A, para ler o poema na integra), em que ele
conta a história de uma gato que vivia dando trabalho para os moradores da
região.
Atenção,
Em verso vou publicá
A história d’um gato
Que come sem lhe custá.
Só o gato engordado
E os morado clamado
Sem te jeito para dá.
Da Varzea de Cima ao Raso
Limpo,
Da Serrote, a Carnaíba,
Esse gato passeava,
Procurando a comida.
A custa dos criador,
Pra ele nunca faltou
Com que encher a barriga.
[...]
Nininho e Ovídio
À noite foram caçar
Depois que andaram um pouco
Viram os cachorros acuar
Chegaram era Rabo Branco
Nininho muito franco
Subiu logo pra laçar.
[...]
Quando foram chegando perto
O gato se arrepiou
Descendo de erva baixo
Com ele se encontrou
Querendo lhe estrangular,
Nininho pra se livrar
Botou o facho e queimou.
Botou o facho na cara
O gato pulou de um lado
Nininho desceu em baixou
Bastantemente assombrado
Dizendo para Ovídio:
“Já viu que gato atrevido?
Me vi um pouco apertado.”
[...] (ARCANJO MOURA, 2014, CD 1)
Este
poema é o mais extenso de todos, possui 25 estrofes.
Conta à história de um gato que aterrorizava a vida
dos moradores na região. O local como afirma o poeta era na
Carnaíba, e na Varzea de Cima, ambos povoados de
Tucano onde o Sr. José Arcanjo residia.
Segundo o
poeta, depois que o gato comeu algumas ovelhas, os criadores ficaram assustados
e contrataram caçadores para matar o felino, mas nem todos conseguiram
captura-lo. O fato criou em torno de si uma redoma de fantasia. Havia
algo de fantástico naquele animal que começou a mexer no imaginário
da gente local.
A fama de Rabo Branco
Já está um pouco crescida,
Já veio do Creguenhem
Aqui para a Carnaíba.
Dois caçadores pra esse gato
Passar a semana no mato
A fim de tirar-lhe a vida.
(ARCANJO MOURA, 2014, CD 1)
Graças a
um caçador, que não se sabe de onde era, o animal é morto e a paz volta a
reinar para os criadores de ovelha. Este caçador era
“Sinhozinho Calazansas”, que segundo o poeta, era um homem misterioso
e “manso” nas ações, talvez uma figura mais misteriosa que o próprio
gato. “[...] Sabe onde as cobras dormem,/ Tem dote da
natureza. [...] ” (ARCANJO
MOURA, 2014, CD 1) Cria-se neste dois personagem a figura
do ser misterioso e do maravilhoso. As proezas do gato e o mistério de
como aquele caçador conseguiu matar a fera que assolava as
criações.
[...]
Sinhozinho Calazansas,
Homem de sorte aplaudida,
Nunca caçou Rabo Branco,
Mas foi quem tirou-lhe a vida.
As ovelhas sossegou,
Sinhozinho foi quem matou
Aquela fera temida.
Ninguém sabe quem é ele
Com aquela macieza,
Sabe onde as cobras dorme
Tem dote da natureza.
Tem cachorro de valor,
Rabo Branco se acabou
Pra ele não teve destreza.
(ARCANJO MOURA, 2014, CD 1)
Logo
depois que o gato é morto os moradores, principalmente os
criadores, procuraram o poeta para pedir-lhe que fizesse um
verso que contasse este fato. O Sr. José Arcanjo compõem o poema
de maneira humorística que é o seu principal estilo, e dar um toque de
ação de maneira quase épica. O humor é visível quando o poeta diz:
[...]
“Eu estou aqui morando
Nuns terrenos de areia,
Ando pra cima e pra baixo
Pisando na mesma aldeia.
Quem tiver cachorro ruim
Não ponha atrás de mim
Eu quero é comer ovelha.”
A sátira
vem, segundo Massaud Moisés (2004, p. 412) da “modalidade
literária ou tom narrativo, consiste na crítica das instituições ou pessoas, na
censura dos males da sociedade ou dos indivíduos. Vizinha da comédia do humor,
do burlesco, da paródia, da ironia, e cognatos [...]”.
No
poema Rabo Branco, o Sr. José Arcanjo, crítica os caçadores por não
terem capacidade de capturarem o gato. Critica também seus cachorros por serem
ruins de caça como o seus donos:
Bota cachorro pelado
Neste gato não convém,
Rabo Branco é sabido
É mimoso e passa bem.
Veio dá seus passos atoa
Quem tem cabelo não acoa
Quanto mais quem não tem.
(ARCANJO MOURA, 2014)
O sujeito
caçador na narração do Sr. José Arcanjo é o foco principal, capturar o
gato, deveres, torna-se a meta principal destes homens que, de certa
forma, não conseguem por estarem despreparados, no que se refere à caça.
[...]
Nessonha a Dé Pereira
Vieram para rastejar
Com dois cachorros de fama
Que só queriam botar
Soltaram na bagaceira
Não viram nem a poeira
Rabo
Branco ficou lá.
(ARCANJO
MOURA, 2014, CD 1)
Estes
temas satíricos de bichos eram muito usados pelos
poetas. Segundo Câmara Cascudo:
Os
sertanejos amam as histórias de bichos, macacos, camaleões, tamanduás, raposas,
preás, vinte outros, falando, governando, discutindo, casando, brigando como
homens. Esses romances de bichos tem efeito seguro no humorismo sertanejo.
Riem descompassadamente, como grandes crianças ouvindo o casamento da
catita com o calangro ou a discussão do urubu com o bode. O intuito
moralista da fabula é evidente e filiar-se-á nas fabulas
de Esopo e Fedro, ensinadas outrora nas escolas paroquiais
dos missionários. (CASCUDO, 1984, p. 20)
Outro
verso do Sr. José Arcanjo que fala sobre animal, é o poema Fumacinha,
curto poema contando um rápido lance sobre uma novilha desgarrada.
(Ver anexo D, para acompanhar o poema na integra).
Corria, corria, gritando
Numa toado comprida
Arrasta, arrasta a novilha
Eu quero ver a caída
Vamos botá-la no chão
Enquanto ver a reação
Do efeito da batida.
[...]
O senhor Dede de Loura
Ele é um pouco atrevido
Veio de longe campear
Num lugar desconhecido
Com vontade de achar
Fumacinha para pegar
No seu cavalo sabido.
[...]
Rastejaram Fumacinha
Durval com seus parentes.
Durval corria gritando
Com seus sobrinhos na frente
Neste dia alcançaram
Fumacinha e derrubaram
No fogo da aguardente.
(ARCANJO MOURA, 2014, CD 1)
Estes
versos mostram a presença do vaqueiro no Sr. José Arcanjo. Na narrativa percebe-se
a ação do vaqueiro em derrubar o boi que foge, esta ação é compreensível
no verso que diz: “corria, corria, gritando/ numa toada comprida/ arrasta,
arrasta a novilha/ quero ver a caída. [...]” José Arcanjo (2014, CD1). Há
aqui, uma ligação do texto do Sr. José Arcanjo com a tradição das poesias
de vaquejada, de pouca ocorrência, mas muito influente para a aparição dos
ciclos do cordel que segundo Câmara Cascudo:
As
poesias de vaquejada e apartação são em número menor e estritamente locais.
Narram às habilidades dos vaqueiros e descrevem a assistência, o coronel, o
vigário, os fazendeiros, as palmas, as vaias, o jantar, abundante, os cavalos
velozes e os animais felizes que escaparam, núcleos de futuras “gestas” ou os
que foram atirados brutalmente no chão numa nuvem de
pó. (CASCUDO, 1984, p.109)
Tendo
sido vaqueiro por muito tempo o Sr. José Arcanjo tem propriedade para
discorrer sobre assuntos de vaquejada. Este poema é a memória viva de sua
cultura de vaqueiro que no labor da luta compôs estes versos.
Paul Zumthor (2010) diz
que estes fatos exaltam o valor moral e a exaltação ao perigo. A
importância coletiva, no que diz respeito à questão da caça e do
caçador; do vaqueiro e do gado, dentro do poema do Sr. José Arcanjo. Também à exaltação
nos feitos fantásticos do animal, abordado em sua
poética.
Os cantos
de caça dos povos africanos, ameríndios, asiáticos [...] se aparentavam,
exaltando o valor moral, a sedução do perigo, o poder imprescindível do
adversário e da natureza: marcando a preparação ou o término das grandes
expedições coletivas, acompanhados de danças, de teatralizações, transformando
em espetáculos as reuniões das sociedades cinegéticas ou os
funerais de um caçador. (ZUMTHOR, 2010, p.101)
A
importância coletiva, no que concerne a questão da caça e do caçador, no
poema Rabo Branco, e a exaltação nos feitos fantásticos
do animal do vaqueiro com a novilha, em Fumacinha, tornam
a poética do Sr. José Arcanjo, memória e registro da população local. E,
como afirmamos antes em Zumthor (2010, p. 101), “[...] transformam em
espetáculos, as reuniões das sociedades [...]”.
Estes
fatos são importantes para a comunidade, como revela
Paul Zumthor, (2010). São feitos de um passado que o poeta retoma a cada
momento em que recita o poema para o público. Há a conservação social a
cada história narrada na voz do poeta.
O
instinto de conservação social continua implicitamente presente na obra em suas
formas, mais raras, de poesia oral narrativa, contando algum acontecimento do
passado que já teve importância para a comunidade... mesmo que hoje ele lhe
seja indiferente; ou nas formas gnômicas, frequentes nas sociedades
tradicionais, onde elas contribuem para a transmissão de um saber comum:
ainda hoje, no campo, tantos ditos rimados e ritmados sobre a condição do tempo
que vai fazer. (ZUMTHOR, 2010, p.
101)
No
poema Lúlu de Dona Morena, versos que
narram às peripécias de um bêbado tentando chegar a
sua casa, não conseguindo achar o caminho, se perde e vive uma pequena
aventura, até que o acham e trazem-no de volta.
Lulú de Dona Morena,
Ele fez uma saída,
Foi passear no pé da serra
Para divertir a vida.
Lá bebeu se embriagou
E nunca mais acertou
Com o caminho da Carnaíba.
Anoiteceu e não chegou
Ficaram em confusão,
Seguiu cinco homens atrás
Procurando informação,
Quem encontrava perguntava,
Disseram que já andava
Com pé calçado outro no chão.
Só deus sabe como ele ficou
Quando se viu embriagado,
Não sabia onde estava,
Um pé no chão, outro calçado.
Por causa da pindaíba
O caminho da Carnaíba
Pra ele era fechado.
(ARCANJO MOURA, 2014, CD 1)
Nas peripécias
feitas pelo bêbado, fica evidente que este personagem não é a figura de um
herói, mas de um sujeito que não está ciente de si, e
comete trapalhadas tentando achar o caminho de casa.
O
poeta chama-nos a atenção para o valor moral desta narrativa,
assim, como vimos antes em Paul Zumthor (2010). O
poema, abarca o conteúdo de uma
mensagem, mostrando o que a bebida pode fazer com o ser
humano. Segundo Zumthor (2010), a poesia oral comporta uma
mensagem para o coletivo, e esta mensagem vem informar, neste
caso, dos perigos do prejuízo do alcoolismo para com os membros da
comunidade. Isso fica evidenciado quando o poeta diz: “Não adiantava
chamar/ que a bêbado ninguém responde”. (ARCANJO MOURA, 2014,
CD1) Aquele que bebe não tem valor para a sociedade, é um sujeito sem
moral, assim podemos conceber na mensagem do poeta.
[...]
Não comeu e nem bebe,
Passou a noite com fome.
Não adiantava chamar
Que a bêbado ninguém responde.
Pelo tanto que ele andou
Nesta noite ele virou
O Bicho-lobisomem.
[...]
Mas tudo isso é o signo
Que Deus lhe deu,
A ordem do criador,
Cada qual pra que nasceu.
Das bodegas ele é freguês,
O futuro que ele fez
A cachaça já comeu.
(ARCANJO MOURA, 2014, CD1)
Nesta última
estrofe há uma passagem que deve ser abordada com ênfase. Diz o
poeta: “Mas tudo isso é o signo/ que Deus lhe deu,/ a ordem do criador,/
Cada qual pra que nasceu./ [...] O futuro que ele fez/ a cachaça
já comeu. [...]” (ARCANJO MOURA, 2010, CD 1). Temos o
que Zumthor (2010) afirma como gnômica, ou seja,
formas que “ [...] contribuem para a transmissão de um saber comum. [...]”
(ZUMTHOR, 2010, p. 101) São os ditos e provérbios do povo
que caracterizam o valor moralizante na poética, e estes versos do
Sr. José Arcanjo, seguem esta mesma linha.
Além dos
poemas satíricos o Sr. José Arcanjo tem versos que mostram um pouco
do seu sentimentalismo e amor. O poema que se segue foi escrito para sua
esposa.
Genita aqui vai escrito
Uns versos para você
Falando sobre o sertão
Que a vida tem mais prazer
Quem se criou-se por lá
Não adota esse lugar
Pouca gente aqui se vê.
Aqui nas motas do sul
O clima é diferente
É um lugar abafado
O ar não comporta a gente.
Eu só tenho alegria
Quando eu voltar um dia
Ao meu sertão florescente.
(ARCANJO
MOURA, 2014, CD 1)
Neste verso, nota-se um
pouco do sentimentalismo e lirismo no poeta, que gosta de sua terra,
que conservar o amor por sua mulher e pelo seu lugar. Isso fica concreto no
verso que se segue.
[...]
Genita, muito longe
De você eu me acho
Ficar aqui muito tempo
Para mim é um fracasso.
Com vontade de te ver,
Desejando receber
De você um forte abraço.
Saudade, muita saudade,
Essa é quem não me consola,
Me lembrando de vocês
Pois não me esqueço uma hora.
Saudade dói que só brava,
Meu peito é uma casa
Onde
vocês todos mora.
(ARCANJO
MOURA, 2014, CD 1)
Câmara
Cascudo (1984) diz que este tema na poesia popular não é tão
explorado. “[...] Todo romance amoroso cantado no sertão é mais ou menos
recente e trabalho individual.” (CASCUDO, 1984,
22) Zumthor (2010, p. 104) afirma que “[...] a instituição
matrimonial , valorizada pela coletividade e engajada na complexidade das
relações econômicas, representa um elemento natural. [...]” Por isso a
necessidade de ter saudades da mulher, uma cultura já enraizada no poeta pela
valorização ao matrimônio e a sua amada.
Quanto à
poesia amorosa, ao discurso personalizado por eu ou tu ou sob
uma capa narrativa, impessoal, um pequeníssimo número de motivos típicos
formalizam, em cantos geralmente bastante breves; motivos primários, fundados
na experiência do desejo, universal de um imaginário erotizado: da vista à
esperança, ao prazer e à amargura. Entretanto, a instituição matrimonial,
valorizada pela coletividade e engajada na complexidade das relações
econômicas, representa um elemento natural – tanto quanto os ciclos do
corpo e da afetividade a que ela se sujeita ou que contraria. Por isso,
sem dúvida todos os folclores do mundo são ricos de cantos nupciais.
(ZUMTHOR, 2010, p. 104)
A forma
com que a poesia é transmitida demonstra a fidelidade do poeta ao seu
amor:
[...]
Genita receba a lembrança
De quem nunca te esqueceu
Vivo cheio de saudade
Meu coração pelo teu
Eu sou firme permanente
Seu amor uma semente
Que no meu peito nasceu.
O poeta
ainda conserva, e o que fica claro é a tradição as cantigas de amor,
e a memória de um tempo provindo da antiga tradição poética da
Idade Média. (Zumthor, 2010). Mas este tipo de poesia como afirmamos
antes, com base em Câmara Cascudo, não é muito explorado no cordel, nem na
poética oral nordestina. Casos como do Sr. José Arcanjo são individuais e
específicos.
Fica evidente que a poesia do Sr.
José Arcanjo é carregada de elementos característicos do poeta simples que se
utiliza da cultura popular e de seu meio regional e
profissional no labor de seus versos. No poema Minha
História, há o saudosismo do tempo de vaqueiro e a tristeza por não poder
mais exercer a profissão.
Na profissão de vaqueiro
Corri muito atrás de gado,
Enfrentei lutas pesadas,
Pegava boi, montava bravo.
Hoje já fui operado
Me acho inutilizado
Relembrando o meu passado.
Porque, alem da idade
Surgiu uma operação.
Sinto uma grande saudade
Que me dói no coração
De hoje não fazer mais nada,
Porque a velhice acaba
Do homem a disposição.
(ARCANJO MOURA, 2014, CD 1)
A
profissão de vaqueiro no aboiar para conduzir ou apartar o gado, modelou a
métrica da poesia do Sr. José Arcanjo e o ajudou a criar o ritmo em
seus poemas. Era no apartar, ou depois das atividades, que
os vaqueiros se reuniam para se divertir e ouvir as
cantorias.
Segundo
Câmara Cascudos: “Os mais antigos versos são justamente
aqueles que descrevem cenas e episódios da pecuária. Os dramas e as
farsas da gadaria viviam na fabulação roufenha dos
cantadores.” (CASCUDO, 1984, p. 115) Evidentemente que o
Sr. José Arcanjo não utilize das toadas e da cantoria para usar em seus
versos. Os versos do Sr José
Arcanjo antes abordados são declamados mas, no
dizer de Câmara Cascudo (1984), as cantorias possuem a mesma métrica, assim, de
certa forma, ajudou a modelar a ritmicidade de sua
poética.
Enfim,
compreende-se no poema Minha História uma nostalgia dos
tempos de mocidade, conceituado assim, mais uma vez o que afirmamos
antes em Paul Zumthor (2010), a forma gnômica de um saber
social, ou a transmissão de um conselho aos mais jovens
a aproveitarem o tempo de mocidade.
[...]
A mocidade e a saúde
Isso é o prazer do homem,
Enfrenta tudo, batalha,
Sua obrigação responde.
Trabalha forte com gosto
O suor molhando o rosto,
Mas tá honrando o seu nome.
[...]
O homem na mocidade
Tem prazer brinca e farreia.
Penetra em tudo com força
Igual ao sangue nas veias.
Digo perante ao povo
Lembrando o tempo de novo
A saudade me judêia.
(ARCANJO MOURA, CD1)
Verifica-se
no poema a mensagem aos mais jovens
para usufruírem da vida enquanto ainda
são moços, sendo assim é relevante observarmos os princípios de
valores e saberes , alem da transmissão da sabedoria por um poeta nos
seus 86 anos de idade.
Para
concluir este tópico, vemos no Sr. José Arcanjo, temáticas não
muito variadas. O humor satírico é o que mais se sobressai em sua
obra. Analisamos também nos poemas como Minha História e Para
minha esposa, que há um certo lirismo e saudosismo
nostálgico, tanto para com a profissão do vaqueiro, quanto para a
mocidade. Tendo vista, com base em Paul Zumthor (2010), que
tais poemas são carregados, em seu conteúdo de uma carga de valores
moralizantes e de saberes, tanto regionais como universais.
A Performance Poética
Para
explicar o desenvolvimento da performance na poética do Sr. José Arcanjo,
iremos, através de um poema, analisar como se dá este desempenho
performático. Este poema é chamado de Testamento do Judas. Não
é um tema novo, mas muito antigo. O próprio nome do poema é dado a todos os
versos nesta temática.
Hoje eu vou morrer queimado
Só me queixo do prefeito
Trabalhei vinte dois anos
Não recebi meus direitos
Nunca tive proteção
Hoje eu to nesta aflição
E ele não me dá jeito.
[...] (ARCANJO MOURA, 2014, CD 1)
Este tipo
de poema era feito para a queima do Judas no sábado de
aleluia. Pedia-se a um determinado poeta, que fosse feito um
testamento deixado por Judas, o qual era representado por um boneco de pano.
Nestes testamentos os poetas utilizavam-se da sátira para com as figuras
ilustres das cidades, que era quem, muita das vezes, financiava este
acontecimento. Por isso na estrofe acima o personagem joga a culpa no prefeito.
Segundo Câmara Cascudo:
Nos
sábados de Aleluia rasgava-se um Judas de pano velho, papel e trapos, no meio
de assuadas. Dizia-se romper a Aleluia. Os Judas eram preparados
secretamente e postos em lugares públicos e mesmo à porta de adversários
políticos. O Sr. Gustavo Barroso recorda que no Ceará, fazia-se outrora um
júri, presidido por pessoa respeitável, para julgá-lo. O veredictum2 infalível condenava-o à forca. Na
maioria dos casos o Judas trazia seu "testamento” em versos de
pé-quebrado, alusivo às pessoas da localidade, com intenções satíricas,
políticas ou apenas humorísticas. (CASCUDO, 1984, p.78)
Na cidade
de Monte Santo – BA-, ainda acontece esta tradição nos Sábados de Aleluia. Em
Tucano ao que parece, esta tradição está se perdendo, mas em muitas
cidades do interior nordestino desenvolve ainda este
acontecimento.
Sendo que
em algumas cidades a tradição é diferente. Em certas localidades no
interior do Nordeste, como Câmara Cascudo (1984) evidencia , o
Judas é rasgado, já nas cidades de Monte Santo e Tucano, ele é
queimado. O Sr. José Arcanjo confirma-nos no verso que diz:
[...]
Falei também com o Gildasio
Pra vê o que ele fazia,
Porque vou morrer queimado
Vê se ele me defendia.
O que ele veio me dizer:
“Pra mim se você morrer
Eu tenho
mais alegria.”
[...] (ARCANJO
MOURA, 2014)
O que
chamamos a atenção, é o testamento que é lido para a comunidade
antes de acontecer à queima. Câmara Cascudo (1984, p. 78) diz que: “ [...]
Na maioria dos casos o Judas trazia seu testamento [...]”. Neste testamento o
poeta coloca os nomes das pessoas que patrocinam o evento, fazendo sátiras com
os sujeitos que custeavam a tradição, ou aproveitava para fazer críticas
políticas aos representantes das cidades.
[...]
Pra Niria eu vou deixar
Um emprego de alegria
Pra ela ficar trabalhando
Em casa de família
Pra ela não perder o ganho
Ela só vai tomar banho
De oito em oito dia.
Pra Dadá eu vou deixar
Uma obrigação mais pouca
Pra ela não se afragelar
Se ela fica louca
E ninguém ta agradecendo
Pra ela pegar por menos
As trouxa pra lavar roupa.
Pra Carminha eu vou deixa
Uma obrigação pesada
Trabalhar em casa de família
Levantar de madrugada
E ela que se afoite
Porque quando for de noite
Ela não aguenta nada.
[...] (ARCANJO MOURA, 2014, CD 1)
Destarte,
estes poemas eram lidos, mas a leitura tinha que
ser declamada em voz alta, pois em alguns casos faltavam
meios eletrônicos como microfone, ou
megafone. Segundo Zumthor (2010) nesta declamação o poeta
utiliza-se de toda sua habilidade oratória para recitar, e fazer
com que sua mensagem seja ouvida e entendida pelo seu público. Para
isso, é necessário a projeção de voz, e teatralização dos assuntos utilizados para
atrair o público.
Estes
traços, mais ou menos claros, manifestam em poesia a oposição
que, por suas funções, distingue a voz da escrita. O texto escrito,
já que subsiste, pode assumir plenamente sua capacidade de futuro: o escritor
desconhecido, segundo o esquema romântico, se convence que está conhecido
dentro de um século. O poeta oral não pode fazê-lo por estar demasiadamente
sujeito à exigência presente do seu público: por outro lado, ele desfruta da
liberdade de retocar seu texto incessantemente, como mostra a prática dos
cantadores. (ZUMTHOR, 2010, p. 138)
Esta
exigência do público, que fala Zumthor (2010) acaba evocando no
poeta a ação de melhor ser entendido, e não apenas ser escutado. A
diferença em ler um poema e recitá-lo, reside no conhecimento do
texto pelo poeta. O texto decorado é perceptível numa maior projeção
de voz e maior performance. Como diz Zumthor (2010, p.
178) “O desejo da voz viva habita toda a poesia, exilada na
escrita. O poeta é voz. [...]” E sendo voz a poesia precisa ser bem
ouvida.
Toda
poesia aspira a se fazer voz; a se fazer, um dia, ouvida: a capturar o
individual incomunicável, numa identificação da mensagem na situação que a
engendra, de sorte que ela cumpra um papel estimulador, como um apelo a ação.
(ZUMTHOR, 2010, p.179)
Acreditamos
que o Sr. José Arcanjo abdica de escrever seus poemas por motivos performáticos
de oratória. Ao declamar seus poemas, já memorizados, há na voz do poeta, uma
maior projeção de voz, um maior entendimento do escritor para com seu texto,no
qual evidencia Zumthor (2010): o desejo vivo da voz entre a
poesia.
A Linguagem Do Poeta
Abrimos
um parêntese neste tópico para falar sobre a linguagem do poeta, que é
visivelmente simples e coloquial, apresentando variações
dialetais como se mostra na estrofe:
[...]
Anoiteceu e não chegou
Ficaram em confusão,
Seguiu cinco homens atrás
Procurando informação,
Quem encontrava eles perguntava,
Disseram que já andava
Com pé
calçado outro no chão
(ARCANJO
MOURA, 2014, CD 1)
No quinto
verso encontramos a frase “quem encontrava eles perguntava”.
Nesta frase os verbos “encontrar” e “perguntar” não faz
concordância com o pronome pessoal “eles”, que está no plural, sendo
a forma correta, na língua padrão:
“quem eles encontravam, perguntavam”.
Esta frase, na
norma padrão, poderia ser classificada como erro, mas
segundo Bagno, (2007) temos neste verso uma variação linguística,
mais propriamente, duas variações: “[...] Variação
morfológica: [...] exibem sufixos diferentes para expressar a mesma
ideia; Variação sintática: [...] o sentido geral é o mesmo, mas os elementos
estão organizados de maneiras diferentes [...] (BAGNO, 2007, p. 40)
Só para
ratificar, a variação linguística é um ramo da Sociolinguística que estuda
a língua pelo viés da variação, ou pela sua heterogeneidade
e tendência em variar. (Bagno, 2007)
Estas
variações dialetais são encontradas na Língua Portuguesa de todo
o território do nosso país. “Identificam-se geográfica e socialmente
as pessoas pela forma que falam. Mas há muitos preconceitos decorrentes do
valor social relativo que é atribuído aos diferentes modos de falar
[...]”. (PCN, 1997 apud BAGNO, 2007, p.27)
Segundo Zumthor “[...]
ocorrem inúmeras tensões entre literatura nacional escrita, uma
poesia oral de dialetos e os esforços ligados a movimentos regionalistas
para criar uma variedade do idioma local. [...]” (ZUMTHOR, 2010, p.37) O
exemplo que Zumthor (2010) aborda, acontece em países com língua
apresentando um nível de variações muito grande, ou com dialetos próprios.
Mas sempre há um nível de tensão muito forte, entre variações
dialetais e língua padrão, surgindo assim o
preconceito.
Por ter
frequentado pouco tempo à escola, o Sr. José Arcanjo, não teve muito contado
com a norma-padrão, ou como diz Bagno (2007, p. 35) “[...] modelo
de língua ‘certo’ de ‘bem fala’ [...]”. Neste sentido, como há em todo o
território formas variantes da língua, o poeta José Arcanjo também apresenta
está heterogeneidade na sua fala. Esta variação é muito forte em sua poesia
justamente, por sua obra ser apresentada oralmente e não
escrita. Sua poética oral reflete a variação linguística de sua
região sendo o contado mais vivo de língua e poesia no que se
refere à poesia ágrafa.
Paralelo Com A Poética Popular Nordestina E A
Estrutura Dos Versos
A poesia
do Sr. José Arcanjo revela, no aspecto da rima, ao que parece, a
mesma estrutura dos versos de cordéis,
tradicionalmente a estrofação de sete
versos. E segue o esquema de rima ABCBDDB. Um
exemplo é o começo de seu poema Lulú de Dona Morena, (destacamos
as partes que rimam, em negrito):
[...]
Lulú de Dona Morena,
Ele fez uma saída
Foi passear no pé da serra
Para divertir a vida
Lá bebeu e se embriagou
E nunca mais acertou
Com o caminho da Carnaíba.
(ARCANJO, 2014, CD 1)
Seus
versos obedecem a constante-rítmica de sete sílabas.
Estes versos, no dizer de Câmara Cascudo (1984), eram os
mais tradicionais. “[...] A métrica se manteve coerentemente dentro das
sete sílabas. Setissilábicas eram as xácaras mais populares, os
romances, as gestas guerreiras. É fácil verificar em qualquer
cancioneiro.” (CASCUDO, 1984, p. 22).
Os
poemas do Sr. José Arcanjo são em boa parte na forma da
redondilha maior, o que dá uma característica bastante rítmica aos seus
versos. Tentamos fazer a escansão de uma parte do poema Rabo
Branco:
[...]
1 2
3 4 5 6 7
Eu/ es/tou/ a/qui/ mo/ran/do
1
2 3 4 5
6 7
Nuns/ te/rre/nos/ de/ a/rei/a
1 2
3 4 5
6 7
An/do/ pra/ ci/ma e/ pra/ bai/xo
1 2
3 4 5
6 7
Pi/san/do/ na/ mes/ma al/de/ia.
1
2 3 4 5
6 7
Quem/ ti/ver/ ca/cho/rro/ ruim/
1
2 3 4 5
6 7
Não/ pó/nha/ a/trás/ de/ mim/,
1 2
3 4 5
6 7
Eu/ que/ro/ é/ co/mer o/vê/lha.
(ARCANJO MOURA, 2014, CD 1)
Devemos
dizer que nem todas as estrofes estão metricamente em redondilhas perfeitas,
alguns fogem da métrica. Veríssimo Melo (1994) diz
muitos cordelistas modernos relaxam e por vezes aparecem algumas
obras com “pé-quebrado”., ou seja, fora da métrica.
Alguns
poetas, como Leandro Gomes de Barros, João Martins de Athayde e outros, eram
mais cuidadosos em relação à métrica e rima dos seus versos. Outros, mais
modernos, relaxam um tanto seus versos, aparecendo muito “pé-quebrado. O
bom poeta de cordel já tem o ritmo do verso no ouvido, a música, que flui
naturalmente, sem esforços. Outros, embora imaginosos, são duros de roer na sua
métrica e rima. É que os poetas populares, em geral, interessa-lhes mais o
conteúdo do que a forma de expressão. (VERISSÍMO, 1994, p. 23)
O poeta
José Aras (1984), em seu poema de cordel Meu Folclore, faz uso
desta mesma estrutura de verso. Este poema conta a historia de Antônio
Conselheiro e a Guerra de Canudos. Nota-se que em cada estrofe tem sete
versos e a métrica, não sistemática, tenta obedecer ao esquema de
sete sílabas.
O leitor já ouviu contar
A história do Conselheiro,
De um simples penitente
Que assombrou o mundo inteiro,
Modesto, honesto e valente
Que fascinou tanta gente
Neste
sertão brasileiro.
[...]
Sua arma era uma vêrga
Na espécie de bastão
Era o tipo de Moisés
Pregando pelo sertão
Imitava no Sinai
E o povo tinha-o por pai
E autor
da Redenção.
(ARAS,
1957 apud CALASANS, 1984, p.77)
José
Aras, já falecido, morava em Euclides da Cunha/BA e José Arcanjo, como
afirmamos antes, reside em Tucano. Estas
cidades vizinhas, morada destes dois poetas, os quais
tem em seus poemas uma estruturação relacionada, e essa
vizinhança reforça a incidência dessa modalidade poética no
mesmo territorio. A diferença entre
ambos é que, os poemas de José
Aras são impressos, e os do poeta José Arcanjo é
memorizado. Lembrando que José Aras foi contemporâneo do Sr. José
Arcanjo. É visível que esta métrica tenha influenciado estes dois
poetas.
Outro
poeta, não muito distante, é o cordelista Antônio Teodoro dos Santos,
chamado de O Poeta Garimpeiro. Este poeta nasceu na cidade
de Jaguarari – BA, e morreu na cidade de Senhor do Bonfim – BA.
Cidades que não estão muito distantes, todas elas fazem parte do
sertão semiárido da Bahia. O poeta Antônio Teodoro dos Santos segue a mesma
versificação que o Sr. José Arcanjo e o cordelista José Aras. No
livro Lampião: o rei do cangaço, publicado pela Editora
Luzeiro, é perceptível a métrica e a versificação do poeta:
Nestes versos
sertanejos
Escritos
por minha mão
Baseados
na memória
Do
cangaço no sertão
Vou
descrever o destino
Do
capitão Virgulino
Que se
chama Lampião.
Cada
pessoa, no mundo
Tem de
cumprir seu destino:
Um é rico
sossegado
Outro
pobre e peregrino
Erra
outro passo a passo
Igual o
rei do cangaço
O
capitão Virgulino.
(SANTOS,
1959, p. 3)
Este
poema conta a biografia de Lampião, Virgulino Ferreira. É um cordel
escrito também no esquema de sete versos cada estrofe, e obedece a métrica de
sete sílabas.
Veríssimo
de Melo (1994), diz que esta é uma forma pouco usual no cordel. As
formas mais utilizadas são as linhas de seis versos, ou sextilhas. [...] Em
menor número encontramos estrofes de sete sílabas e em décimas. [...]” (MELO,
1994, p.23)
Salienta-se
que os folhetos de temas tradicionais e os de época ou “acontecidos”, obedecem
àqueles tipos de estrofes (sextilhas, setilhas e décimas). Todavia,
no que se refere aos folhetos de peleja ou desafios, a formação é também
bastante variada, apresentando-se em mourões, galopes a beira-mar, gemedeiras,
etc. (MELO, 1994, p. 23)
É
importante salientar que a poesia oral se flexibiliza, e não dispõe do
rigor da escrita. Zumthor afirma que:
Em geral,
as realizações orais de um sistema de versificação oferecem uma gama mais
limitada que os da escrita. Enquanto a escrita individual, com a liberdade que
lhe é própria, se evada facilmente do sistema, interiorizando-o, a voz pode
apenas flexibilizá-la, exagerando suas regras em algum ponto
particular [...]. (ZUMTHOR, 2010, p.192)
Mesmo a
poesia oral se flexibilizando, tendendo-se a ser maleável ao sistema imposto,
que é mais rigoroso na poesia escrita, a obra do Sr. José Arcanjo obedece
ao esquema de rimas do cordel e não tenta fugir deste sistema, pelo
contrario, todos os seus poemas seguem a versificação de sete versos e a
metrificação da sete sílabas.
Fazendo
estas comparações entre estes três poetas, podemos concluir que o Sr.
José Arcanjo segue a mesma métrica, a métrica do cordel. Tanto a
temática, a linguagem, a performance e a estrutura do verso correspondem
à tradição da poesia de cordel. Sendo o cordel escrito, e a poesia do
Sr. José Arcanjo oral, não podemos dizer que o poeta não tenha contato com
o cordel, tendo em vista há uma semelhança gritante entre sua
obra e a tradição do cordel. Zumthor (2010, p.177) diz
que, “toda palavra poética (passa ou não pela escrita) emerge de um lugar
interior e incerto que, bem ou mal, se nomeia por metáfora: fonte,
fundo, eu, vida [...]”.
Acreditamos
que esta métrica cordelística na obra do Sr. José Arcanjo, tenha
provindo do contato que este autor teve com feirantes de cordel. Como abordamos
antes, está era a literatura que as pessoas do interior nordestino tinham
contato. A métrica do cordel modelou os poemas do Sr. José
Arcanjo.
Possuindo o
mesmo esquema de métrica e rima do cordel, a obra do Sr. José
Arcanjo segue uma tradição da cantoria nordestina do cordel. Significa
dizer que o poeta guarda em sua memória: um registro cultural difundido em
sua localidade, abrangendo a cultura
histórica e singularizada de um povo. Esse não é um bem
individual, mais sim, um bem universal refletido na sua poesia. (Zumthor,
2010).
REFERÊNCIAS
ARCANJO MOURA, José. Entrevista e Poemas. Entrevistador: Paulo Monteiro dos Santos. Tucano –BA, 2014, CD1.
BAGNO, Marcos. Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguística. São Paulo: Parábola Editorial, 2007.
CALASANS,
José. Canudos na Literatura de Cordel. São Paulo: Ática, 1984.
CASCUDO,
Luis da Câmara. Vaqueiros e Cantadores. São Paulo: Ed da Universidade de São Paulo, 1984.
COMPAGNOM,
Antoine. O demônio da teoria: literatura e senso comum. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001.
CURRAN,
Mark J. História do Brasil em Cordel. São Paulo: EDUSP, 1998.
HOUAISS,
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Eva Maria & MARCONI, Marina de Andrade. Metodologia do Trabalho Cientifico. - 6. Ed – São Paulo: Atlas, 2001.
LÉVI-STRAUSS,
Claude. Mito e Significado. Disponível em: < https//sabotagem.revolt.org > Acessado em 2 de Mar.
2014.
MELO,
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[1] Graduado em Letras pela Universidade do Estado da
Bahia (UNEB) email: paulus.monterum@gmail.com
[2] Este trabalho me servil como conclusão de curso de
graduação prestado a Universidade do Estado da Bahia.