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domingo, 11 de novembro de 2018

CONFERÊNCIA: MISERICÓRDIA EM TEMPOS DE PÓS-VERDADE - PROF. BORTOLO VALLE 26/10/2018. SALÃO DA FACULDADE VICENTINA – CURITIBA/PR



Qual a condição das histórias do passado para o homem? Antes de respondermos, devemos saber que estas histórias são todas fictícias. Sua condição é nos tirar dessa realidade; nos tirar do mundo. Os mitos e religiões, têm como núcleo, o paradoxo. No fundo os nossos relatos é para responder quem somos, ou responder o que é o homem. Mas Deus não pergunta ao homem o que ele é, ou quem ele é, mas “onde estás”? (Gn. 3,9). A pergunta mais cabal em nossos tempos, não é saber quem somos, mas é saber onde estamos, e como sair do lugar em que estamos.  
Em tempos de pós-verdade não existem mentiras e isso é assustador, já que se os relatos e fake newsfossem mentiras, poderíamos reparar os fatos. A mentira é uma verdade e é feita para não durar. E a verdade que mais nos interessa é a que não dura. Esta verdade deve ser feita para o futuro, pois não podem durar no eterno presente. E mesmo as verdades eternas, devem não durar. O que é o amor hoje? Assim como as verdades, a misericórdia (tema central desta conferência) não foi feita para durar.  
A verdade tornou-se uma mercadoria: Hoje ela é feita para ser comprada nas prateleiras dos supermercados. E se ela é uma mercadoria ela tem seus produtores, pessoas que são pagas para elaborarem verdades. A verdade é icônica: A verdade foi feita para ser olhada pelas pessoas; vista, vislumbrada. Deve ser impactante, só assim ela nos prende a atenção. Esta verdade é delirante: Ela tem uma resposta para cada uma de nossas necessidades.  
Assim surge a pergunta de não nos preocuparmos de sabermos quem somos, mas onde estamos. A sociedade humana quer se situar no espaço-tempoentre um passado e um futuro. Um passado perdido, que não tem volta e um futuro de proposta que nunca chegam. Mas onde fica a misericórdia nessa história? Ela tem um nome que é “cuidado”. Hoje não temos mais cuidado com os outros nem com o mundo. Como vamos entender da misericórdia nesse mundo da falta de comprometimento? De certo modo, a misericórdia também tornou-se uma mercadoria. Ela é icônica e produzida. 
Hoje nós nos amamos virtualmente. Sou capaz de me comover com pessoas morrendo na TV, mas não com os mendigos da rua de casa. E os produtores das verdades sabem disso. Nós temos que pensar e repensar o que significa o “cuidade” (misericórdia). Então, não devemos olhar como um cálculo, mas num sentido de “cuidado”. Pascal afirmava que temos que ter um comprometimento com o outro como em forma de empatiaAtrás de um corpo tem um ser-aí. 
Nos tempos de pós-verdades, nós estamos vendendo o corpo, limitando o conhecimento do outro apenas ao corpo. O homem não é só um corpo, é um ser para o espírito. Hoje não sentimos com as pessoas seus sofrimentos. Para onde vai nos levar esses tempos de pós-verdades sem misericórdia? Se não nos comprometermos com o olhar de misericórdia ao outro, como vamos viver em tempos de pós-verdades? 
                 


Bortolo Valle 
Filósofo

ARTIGO: MATÉRIA E A FORMA EM ARISTÓTELES


RESUMO: Este artigo tem por objetivo dissertar, de forma sintética, sobre o tema da Matéria e Forma na Filosofia de Aristóteles, tendo em vista as implicações que esta teoria põem em discussão, o problema do Ato e Potência, Substância e o Motor Imóvel. Também se buscou, neste artigo, mostrar uma breve demonstração da crítica que Aristóteles faz a teoria do mundo das Ideias de Platão, e de como Aristóteles faz surgir uma nova análise sobre a Metafísica, a tal ponto que está Metafísica, proposta por Aristóteles, mudou de maneira radical o modo como vemos a Matéria e o mundo das Formas.



INTRODUÇÃO

Aristóteles (385 a.C) nasceu em Estagira, na Macedónia. Estagira era uma cidade considerada grega, pois foi fundada pelos gregos de cultura jônica.  Por ser de uma família que tinha tradição na medicina, Aristóteles manifestou interesse também na natureza. Seu pai, Nicômaco, era médico e foi consultou do rei da Macedônia. Nos seus 18 anos, Aristóteles vai para Atenas, onde passa a estudar na academia de Platão. (CHAUÍ, 2000, p.334). 
Platão o influenciou de maneira tal que a marca platônica ficou em sua filosofia, mesmo Aristóteles superando-o em muitos pontos, as influências de Platão e sua característica metafísica acompanharam Aristóteles, e foi o que de mais se discutiu em sua obra até os dias de hoje. Aristóteles morreu em 321 a.C, com a idade de 63 anos. (CHAUÍ, 2000, p. 334). 
Neste pequeno texto trataremos do tema Matéria e Forma em Aristóteles. Sendo esse assunto um conteúdo que corresponde a todo um sistema ontológico, faz-se necessário tratar do tema da Metafísica, com o objetivo apenas de conceituar esses dois elementos, matéria e forma, na filosofia aristotélica.  
Vele lembrar que o termo Metafísica não foi usado por Aristóteles. Esse termo foi usado por um organizador das obras de Aristóteles, Andrônico de Rodes, que no século I catalogou as obras de Aristóteles. Este Andrônico, utilizou o termo metafísica para classificar os textos aristotélicos como aquela ciência que está além das ciências físicas. Aristóteles chamou essas ciências, na verdade, de ciências primeiras. (CHAUÍ, 2000).

1 CRÍTICA A TEORIA DE PLATÃO SOBRE O MUNDO DAS IDEIAS


Antes de iniciarmos, alguns pontos devem ser colocados principalmente pelo fato de a teoria de Aristóteles ser uma crítica a teoria de Platão. Conforme essa crítica Aristóteles constrói toda a sua teoria metafísica. 

Ora, ao dar às Formas um estatuto ontológico forte – elas são o ser – e separá-las num mundo inteligível eterno à parte, Platão impossibilitou que elas pudessem explicar o mundo sensível, pois nada há em comum entre eles. O sensível se reduz a uma aparência degradada ou uma deformação do inteligível e o filósofo é convidado a abandoná-la em lugar de compreendê-lo. Epistemologicamente, a teoria das Ideias é inútil. (CHAUÍ, 2000, p.352)

Sendo o mundo sensível um mundo apenas de sombras, não se pode conhecer nem analisar tal mundo. Dessa forma realmente é inútil, pois sendo as Ideias realidades em si mesmo, não servem para conhecermos a realidade em nosso mundo. Para Aristóteles as Formas não são realidades em si mesmo, mas são " [...] a unidade inteligível da multiplicidade sensível [...]" (CHAUÍ, 2000, p.352).  
Aristóteles critica vários pontos em Platão. Primeiro é a duplicação desnecessária da realidade. Platão duplica a realidade em dois mundos e com isso não consegue resolver a aporia que é apresentada no mundo sensível, já que essas aporias se apresentam no mundo das Ideias. Um exemplo é a Ideia de identidade; multiplicidade e de diferença. Aporias suscitadas em Heráclito e Parmênides. Ou seja, as antinomias que se apresentam no mundo sensível, também se apresentam no mundo inteligível. (CHAUÍ, 2000, p.352). 
Segundo ponto: Para Aristóteles a teoria da participação de Platão não faz sentido já que "[...] para dizermos que uma coisa particular é o que é porque participa de uma ideia com a qual tem semelhança da cópia com o modelo, será preciso encontrar uma terceira ideia, [...] mas, para dizer que uma ideia participa de uma outra, precisamos de uma quarta ideia que sirva de modelo as outras duas e assim indefinidamente. [...]" (CHAUÍ, 2000, p.352).  
O terceiro problema que Aristóteles vê em Platão é: Se há uma ideia para cada coisa no mundo então deve-se haver também uma ideia de relação, mas uma relação não possui ideia de nada porque não é uma coisa no mundo. "[...] Portanto, não pode haver ideia de relação. [...]" (CHAUÍ, 2000, p.353). E sem a ideia de relação como justificar a relação das coisas no mundo? 
No quarto problema, Aristóteles fala que se há a ideia do positivo, do belo e etc, deve-se haver também a ideia do mal, do negativo. Se a ideia de beleza, deve-se haver a ideia da não-beleza. Deve-se haver ideia não apenas para o negativo, mas para os modos das coisas, assim essa concepção platônica acaba indo para um infinito mundo de ideias, o que para Aristóteles é absurdo. (CHAUÍ, 2000, p.353).  
No quinto problema, apontado por Aristóteles, a teoria de Platão não diz como é a gêneses das coisas. As Ideias para Platão são eternas e o Demiurgo apenas modela as coisas, que são prontas e acabadas. A teoria de Platão não explica como o mundo sensível da origem as coisas. Por fim, no sexto problema, as Ideias impedem que o mundo sensível tenha inteligibilidade, assim o mundo sensível é irracional e não pode ser conhecido. " [...] As ideias roubam o sentido do mundo, em vez de dar-lhes sentido." (CHAUÍ, 2000, p.354). 
Concluindo essa crítica as teorias platônicas, Aristóteles vai dizer que a "forma (o eídos[...] determina a identidade de uma coisa, determina o que ela é em sua essência, e se encontra na própria coisa, cabendo ao pensamento separar intelectualmente a forma (universal) e a coisa (singular), isto é, separar a forma da materialidade da coisa." (CHAUÍ, 2000, p.356).

2 A CONCEPÇÃO DE MATÉRIA E FORMA EM ARISTÓTELES
  
Não existe para Aristóteles um mundo aparte de ideias. A ideia está na própria coisa, unida entre forma e matéria, onde uma dá sustento à existência da outra, cabendo ao pensamento fazer uma abstração e separar as duas. Pelo pensamento é que podemos conhecer o universal, aquilo que é necessário e que está na coisa sensível e não em um mundo fora da materialidade.  Passamos agora a analisar como chegamos a ideia da forma e da matéria começando pela teoria das Categorias de Aristóteles (CHAUÍ, 2000, p.357).
Aristóteles afirma que o ser se diz de várias maneiras (CHAUÍ, 2000, p.358), mais propriamente em 10 categorias: 1) Substância, ou essência; 2) Quantidade; 3) Qualidade; 4) Relação; 5) Lugar; 6) Tempo; 7) Posição; 8) Posse; 9) Ação; 10) Paixão. Essas categorias são os modos do ser e servem para que o pensamento possa conhecer este ser e exprimi-lo. 

Do ponto de vista gramatical, as categorias correspondem ao substantivo, adjetivo, advérbio e verbo. Essa unidade entre gramática e lógica indica não só a unidade entre linguagem e pensamento, mas também a unidade entre dizer, pensar e ser. [...] (CHAUÍ, 2000, p.360)

Destas categorias a mais importante é a da substância, pois em ralação a ela as outras categorias são apenas predicadas ou atributos da substância. A substância é um substrato que suporta as outras categorias. Por isso se diz que as outras categorias são os acidentes da substância. (CHAUÍ, 2000, p.361). É na substância onde se há o conjunto: matéria, forma e individualidade.  
O que vem a ser a Matéria para Aristóteles? A matéria é a substancia como suporte, substrato. Sujeito que pode se conceber com propriedades, "[...] justamente porque em si mesmo e por si mesmo ela não possui nenhuma. [...]"  (CHAUÍ, 2000, p. 392). O que vem a ser a Forma? A forma é quem vai determinar, pois ela é a substancia como essência. É ela quem dá atributos e propriedades a matéria.  
Explicaremos melhor com as palavras de Nunes quando este autor afirma que matéria é possibilidade dê, e a forma o ato: (NUNES, 2009, p. 27). 

[...] Simples potencia ou possibilidade, a matéria, cujo sentido metafísico tem por base a conotação artesanal de hyle, necessita de uma forma (morphe), que a delimite e determine. Longe estamos, porém, do universo platônico, em que a forma, como ideia, subsiste separada das coisas, num mundo inteligível. Para Aristóteles, ela não é essência universal, mas princípio ativo, verdadeiro ato que determina a matéria ou potência, atualiza as aptidões nela esboçadas e produz um ser perfeito, substancial. A forma é causa intrínseca do nascimento, crescimento e conservação dos serres naturais. Ela é, para empregarmos a palavra consagrada, que significa princípio originário e organizador, enteléquia. (NUNES, 2009, p. 27) 

Essa explicação nos leva a dizer que a matéria tem em si a potência, e a forma a do ato. A Matéria é atividade que possibilita algo. A Forma a, atualiza, a “coisa”, (matéria). A palavra Matéria se origina da palavra madeira “[...] hyle, em grego. [...]" (NUNES, 2009, p. 27). Acreditamos, e essa é nossa opinião, que aquilo que reveste a matéria precisa de algo que determine a possibilidade da matéria se atualizar, e atualizar aqui significar mudar. A matéria precisa da Forma.
 A Forma é (e partimos de Nunes (2009) nesta nossa afirmação) um principio ativo na Matéria. É algo que da condição a possibilidade da Matéria se atualizar. A grosso modo, a Forma é um principio originador que faz a matéria se tomar em “forma”[1]. E aqui está um fundamento básico: A Matéria tem que ter uma “forma”, pois sem “forma” ela é indeterminada. Por isso, a Matéria deve ser determinada pela Forma, se não, fica-se impossível pensar a Matéria, porque sem “forma” não há nada para se pensar.  Por essa razão Nunes (2009) afirma que é um principio originário e organizar. É enteléquia, pensável.
Podemos então dizer que a Forma, por exemplo no artista, é uma ideia que este modela e atualizar na Matéria que ele trabalha (NUNES, 2009, p.27). Assim, a Natureza também é uma matéria atualizada por Deus, um ato puro, Forma das formas. Assim, chegamos a ideia de Aristóteles no Motor Imóvel. Pelo Motor Imóvel, Aristóteles vai justificar a causa do movimento. Uma Causa final. (NUNES, 2009, p. 27). Neste ponto, se diz que a teoria aristotélica é determinista.

CONCLUSÃO

A teoria de Aristóteles sobre Matéria e Forma é apenas uma parte de toda uma metafísica que, de certa forma, resolveu muitas lacunas que antes se via na teoria platônica. A bem da verdade, Aristóteles modificou de maneira radical as ideias de Platão, unindo a Forma (Ideias) a Matéria (Sensivel), e eliminando o conceito de Sombras dito por Platão. Assim pela Matéria como Potência e a Forma como Ato, Aristóteles garante o movimento no mundo e os princípios lógicos da razão, unindo Heráclito a Parmênides.   

REFERENCIAS






CHAUÍ, Marilena. Introdução à História da Filosofia: Dos pré-socráticos a Aristóteles. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.

NUNES, Benedito. Introdução a Filosofia da Arte. São Paulo: Editora Ática, 2009


PAULO MONTEIRO DOS SANTOS:
Graduado em Filosofia - FAVI; Graduado em Letras- UNEB;
Email: paulus.monterum@gmail.com



[1] Essa palavra forma, com aspas, que dizer não ao conceito de forma em Aristóteles, mas ao mudo corriqueiro.