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domingo, 2 de dezembro de 2018

CRÍTICA À METAFÍSICA FEITA POR IMMANUEL KANT



 Paulo Monteiro dos Santos[1]


RESUMO: O presente trabalho tem como fim: descrever a crítica dada por Kant em relação á capacidade do conhecimento humano de saber sobre a metafísica e até onde este se limita. Também tentou-se neste artigo fazer uma síntese sobre as discussões a metafísica, desde Platão até Hume. Notou-se, por fim, que Kant bloqueia o conhecimento em relação a metafísica, mas não impossibilita sua existência.

PALAVRAS-CHAVES: Kant. Metafísica. Conhecimento
                                                                                                                               
INTRODUÇÃO

O presente artigo faz um apanhado geral da crítica que faz Kant a metafísica. Na primeira parte se pretende discutir a relação da filosofia grega e da cristã, o que resultou de um mesmo significado, no que tange a explicação da realidade pela teoria realista, mas estas diferem no que diz respeito à explicação do mundo pela origem. A grega diz que a origem se dá de forma emanentista; a cristã protesta, dizendo que a origem é criacionista, onde Deus criou o mundo.
Logo em seguida, Descartes e Bacon, retiram a ideia de uma explicação realista do mundo, afirmando que o mundo não é do jeito que vemos, pois este pode nos enganar. Descartes e Bacon dá mais importância a razão. Por ela devemos olhar o mundo livrando-o dos preconceitos. 
Estes filósofos revolucionam a ciência apresentando um novo modelo. Mas é Kant, com sua crítica ao conhecimento, quem fundamenta a teoria dos juízos, porém sua teoria, de certo modo, condenou a possibilidade de qualquer conhecimento a metafísica. Vamos entender como Kant chegou a tal conclusão.

1 HISTÓRICO DO PROBLEMA NA METAFÍSICA

Podemos perceber que a metafísica foi primeiro exposta por Platão em sua teoria do mundo das formas, onde este filósofo tentou dar uma explicação do tipo realista para descrever o mundo e a realidade que se mostra ao homem. Neste sentido Platão divide a realidade em duas: 1) mundo das formas – eidos - 2) mundo material – sombras - , onde o mundo material engana nossos sentidos, e
por essa razão, devemos buscar o conhecimento no mundo das formas, pois, nesse se encontra as verdades eternas e perfeitas (ANTISERI; REALE, 1990). Essa explicação, embora não tenha um caráter sistemático como em Aristóteles, foi a primeira grande síntese entre as filosofias de Heráclito, do movimento, e de Parmênides, sobre o ser. Mas Platão não explica de forma clara como se dá a passagem entre as formas e o mundo material. Colocando um deus modelador, Demiurgo, ou explicando pelo mito da caverna (CHAUÍ, 2000, p. 352); (CHAUÍ, 2000, p. 354)[2]. O primeiro a tentar fazer uma sistematização da metafísica foi Aristóteles, que a chamou de filosofia primeira, ou teologia (ANTISERI; REALE, 1990, p. 179). Este filósofo buscou estudar o ser, a substância e a essência. (ANTISERI; REALE, 1990). Tentou também resolver a problemática deixada por Platão sobre a questão do movimento entre matéria e forma, o qual ele explicou como ato e potência.
Porém, com a mudança da perspectiva cultural do ocidente entre o cristianismo e a cultura grega, a filosofia ganha uma nova leitura: Sai o “logos” grego e entra o “logos” cristão, e para o cristianismo as coisas não emanavam de um mundo das ideias ou de um motor imóvel, mas elas foram criadas por um Deus que em si, é monoteísta. Embora a filosofia cristã tenha assimilado muitas teorias do tipo platônicas, ela tinha uma enorme diferença em sua explicação para a origem das coisas. E seu maior nome foi Santo Agostinho. Este filósofo, com base em suas análises
hermenêuticas na Bíblia, vai dizer que Deus criou as coisas do “nada” (AGOSTINHO, 1975, p. 327). E aqui, ao menos é o que defendemos, há uma cisão e negação da cultura grega. A metafísica deixa de ser uma explicação da eminência para ter uma explicação criacionista. O cristianismo passou a dar maior “liberdade” ao homem, e pensamos que não apenas ao homem, mas também ao mundo (ANTISERI; REALE, 1990).
Santo Tomás de Aquino, outro grande nome da filosofia cristã, vai assimilar a filosofia de Aristóteles e sua teoria do ato e potência, à filosofia escolástica e mostrar pelo estudo da metafísica, a existência de Deus, e explicar a realidade do mundo, sobre esse ponto de vista. Mas tanto a filosofia grega como a cristã, entendiam o mundo de forma radicalmente realista. Ou seja, o mundo existia independentemente do homem para justificá-lo, o que preocupavam cristãos e gregos era saber qual era sua origem.
Descarte, que tinha por princípio uma filosofia racionalista, se opunha a filosofia aristotélica da escolástica. (ANTISERI; REALE, 2004, p. 287), se oponha porque para o racionalismo a verdade não depende do mundo, mas da minha própria condição de pensar. Se o mundo que vejo depende exclusivamente de meu pensamento para existir, é correto dizer que tudo o que vejo é apenas Ideias. Ideias da coisa pensante. (ANTISERI; REALE, 2004, p. 287)

A explicação anterior a Descartes, era realista. Assim, antes da modernidade, a realidade era algo determinado por leis da natureza criadas por Deus ou por um Sumo-Bem. O homem se enquadrava nestas leis e era determinado por elas. Descartes e Bacon proclamaram que as leis podem ser conhecidas pelo homem. E o homem pode modificar e manipular as leis da natureza. A grande questão era que, para Descartes, nós já tínhamos ideias inatas e não precisávamos de nenhuma experiência para conhecer as leis da natureza. (ANTISERI; REALE, 2005)
Para John Locke, (Inglaterra, 1632-1704) a mente era uma tabula rasa. Não há nada em nosso intelecto, ele recebe o material unicamente pela experiência em contato com o mundo. O empirismo que Locke proclamava é o de não apenas analisar o objeto, assim como orienta Bacon, mas de examinar a condição do sujeito frente ao objeto. Para isso Locke afirma que o conhecimento depende unicamente da experiência. (ANTISERI; REALE, 2005, p. 93) Com essa crítica ao inatismo cartesiano, Locke, e os principais filósofos ingleses vão defender uma teoria do conhecimento sobre o ponto de partida do empirismo. David Hume vai levar o empirismo a últimas consequências, formulando um ceticismo moderado, onde diz que todo o intelecto não passa de impressões, ideias e suas ligações estruturais. Não há necessidade no mundo, essas coisas são fruto da nossa capacidade intelectual. O mundo é tão somente contingente. (ANTISERI; REALE, 2005, p.133-138)  
Tanto os empiristas quanto os racionalistas defendiam uma concepção idealista do mundo, embora ambos, com explicações diferentes sobre o processo de como se dava o conhecimento. Será Kant, com seu criticismo, que unirá as duas grandes correntes na teoria dos juízos sintéticos a priori. Mas Kant levará as últimas consequências as teorias idealista da razão, negando a possibilidade de um conhecimento metafísico.

2 CRÍTICA DE KANT A METAFÍSICA

Kant, deu toda razão a Hume. Hume o acordou de um sonho dogmático, assim diz Kant. (PASCAL, 2008, p. 29-30). A causalidade não tem fundamento. O sonho da ciência era formar um princípio necessário e universal, mas não há um determinismo causal na natureza. Kant percebeu que
havia um confronto entre a ciência de Isaac Newton e o ceticismo de Hume. Além disso o embate entre empirismo e racionalismo.  Kant não era por certo um cético radical como Hume, mas havia verdades que eram universais e não apenas contingentes. "Como efeito, o empirismo cético de Hume e, em particular, a sua crítica da noção de causalidade, tornava incertas as posições do racionalismo dogmático. [...]" (PASCAL, 2008, p. 29-30). Assim Kant retoma a análise dos juízos: Analíticos e Sintéticos.
Kant chega a uma conclusão, que os juízos só são sintéticos a priori. Eles não são apenas sintéticos e analíticos. Há verdade nas discussões de empiristas e inatistas. Há relação entre a experiência e o sujeito conhecedor.

Mas a grande descoberta de Kant, a que confere todo o seu alcance à sua "revolução copernicana", é a da existência de uma terceira classe de juízos, os juízos sintéticos a priori. Estes são universais e necessários, como os juízos analíticos, mas, além disso, nos permitem ampliar os nossos conhecimentos, enquanto os juízos analíticos apenas podem explicá-los ou esclarecê-los. (PASCAL, 2008, p. 39)

Na Crítica da Razão Pura, Kant cria um sistema de faculdade para um sujeito que é transcendental. E estas faculdades são comuns a todos não apenas para um único sujeito. Na filosofia de Kant temos uma teoria da mente. (PASCAL, 2008, p. 69) A ideia básica para conhecer é matéria e
forma, assim como na teoria de Aristóteles, mas a coisa em si mesmo não podemos conhecer. A coisa em si mesmo é um caos. Nós é que pomos a forma para organizar, dar ordem a esse caos.  (PASCAL, 2008, p. 69). O sujeito transcendental, dito por Kant, tem um sistema de capacidades que pode compreender sobre a percepção do mundo, e pensar sobre o mundo. Essas capacidades devem também compreender os conceitos formulados nesse sujeito.
Temos a capacidade da sensibilidade a primeira faculdade do sujeito transcendental, e ela nos fornecem a intuição. A intuição é uma percepção imediata de fatos empíricos. O sujeito também tem a faculdade de formular conceitos, essa faculdade é do entendimento. A faculdade do entendimento se dá pelas categorias, que são doze. Tais categorias nos dão a capacidade do entendimento. Há ainda outra faculdade que liga entendimento com a faculdade da sensibilidade ela é a imaginação. Não a imaginação de ilusão, mas uma imaginação transcendental.  (PASCAL, 2008, p. 62)
 A imaginação liga a intuição aos conceitos e o resultado desta ligação são os juízos, que por sua feita, resultam nos fenômenos. A junção entre a Estética Transcendental e a Analítica Transcendental, surge a Dialética Transcendental. Na Dialética, Kant escreve sobre a Razão, assim ele aborda coisas da não sensibilidade. O conhecimento é agora uma produção humana que não apenas observa, pois, o objeto não é simplesmente dado. O problema é que a razão nesse processo de conhecer busca sempre ir além de sua capacidade. (KANT, 1980, p. 25)

Esses problemas inevitáveis da própria razão pura são Deus, Liberdade e Imortalidade. A ciência, porém, cujo propósito último está propriamente dirigido com todo o seu aparato só à solução desses problemas denomina-se metafísica; o procedimento desta é de início dogmático, ou seja, assume confiantemente a sua execução sem um exame prévio da capacidade ou incapacidade da razão para um tão grande empreendimento. (KANT, 1980, p. 25)

A razão busca ir além do fenômeno, ela quer se elevar ao ser-em-si, conhecer o Númeno. (Kant não chama de Ser, mas coisa-em-si). A razão sempre nos leva ao metafísico e o grande problema da metafisica é que ele mostra conceitos sem intuições. Mas a grande questão se encontra na necessidade de a razão buscar ir além das suas capacidades, suas condições de possibilidades no processo de conhecimento. Mas sem esse propósito nos diz Kant que os avanços na própria ciência se limitam. É essencial para a razão ir além.

[...] Com efeito, sem ser movida pela mera vaidade da erudição, mas impelida pela sua própria necessidade, a razão humana progride irresistivelmente até perguntas que não podem ser respondidas por nenhum uso da razão na experiência nem por princípios ai tomados emprestados, e assim alguma metafísica sempre existiu e continuará a existir realmente em todos os homens, tão logo a razão se estenda neles até a especulação. (KANT, 1980, p. 25)

A questão para Kant é como surge na razão pura as perguntas que a própria razão humana buscar responder, de maneira necessária, além disso, de maneira que estas questões, levantadas pela razão humana, são tratadas de forma como se estivessem no mundo natural. Tais questões são Deus, a Imortalidade da Alma, e a Liberdade.

Todavia, estes raciocínios, que resultam da própria natureza da razão, são outros tantos sofismas, e é ao estudo desses raciocínios sofísticos que Kant consagra a segunda parte da Dialética transcendental, intitulada " Dos raciocínios dialéticos da razão". Os sofismas que conduzem à ideia de alma, e são chamados paralogismos da razão pura, constituem a Psicologia racional. A ideia de mundo, objeto da Cosmologia racional, inspira os raciocínios contraditórios chamados antinomias da razão pura, os quais são igualmente verdadeiros ou igualmente falsos. E, enfim, a Teologia racional, que trata do ideal da razão pura, ou seja, de Deus, contém os sofismas pelos quais se pretende demonstrar a existência de um Ser supremo.  (PASCAL, 2008, p. 95)





CONCLUSÃO

Com isso fica evidente que Kant não quis mostrar nenhum princípio do Ser, mas sim o princípio do conhecer. (NÓBREGA, 2011, 39) Assim Kant faz uma Teoria do Conhecimento, e não uma metafísica. Ao contrário, Kant de certa forma bloqueia o caminho a metafísica como uma ciência. "O que diferencia os conhecimentos racionais da matemática e da física, dos da metafísica é que aqueles são juízos sintéticos a priori, e estes, juízos analíticos." (PASCAL, 2008, p. 39) A ideia de Imortalidade da alma, a cosmologia e de Deus, são ideias incognoscíveis. Esse fato, da impossibilidade da metafísica como ciência, causou uma ruptura no modo de pensar a filosofia. A metafísica parte de princípios postulados, os quais a razão afirma, mas não conhece. O que podemos conhecer só o pode dentro das categorias, e nada mais, além disso.

REFERÊNCIAS

CHAUÍ, Marilena. Introdução à História da Filosofia: Dos pré-socráticos a Aristóteles. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.

KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. In: ______.  Immanuel Kant. Tradução de Valerio Rohden e Udo Baldur Moosburger. São Paulo: Abril Cultura, 1980. v. 1. (Coleção Os pensadores).

NÓBREGA, Francisco Pereira. Compreender Hegel. 6. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

PASCAL, Georges. Compreender Kant. Tradução de Raimundo Vier. 6. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario.  História da Filosofia: Filosofia pagã antiga e medieval.Tradução de Ivo Storniolo. São Paulo: Paulus, 1990. v. 1. (História da Filosofia).




SANTOS, Paulo Monteiro. O problema do nada na filosofia existencialista de Jean-Paul Sartre. 2018. 1 f. Monografia (Bacharelado em Filosofia) - Faculdade Vicentina, Curitiba, 2018.                                                              



[1] Graduando do Curso de Filosofia na Faculdade Vicentina. E-mail: paulus.monterum@gmail.com
[2] Estas ideias estão mais bem expostas no meu artigo “Matéria e Forma” em Aristóteles