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sexta-feira, 10 de abril de 2015

SETE ASSASSINATOS


Amigos de minha terra
Quero agora lhes contá
Um fato que se encerra
Em minha cidade natá
Não foi sorte nem guerra
Mas vidas pré-natás.

As secas que aqui andaram
Deixaram nas mães o pavô
E os seus filhos largaram
A sorte que a vida deixou
As luzes da vida falaram:
Se é morte infantil é dor.

Era um mês frio de junho
Chovia como que faz sol
As minhocas faziam túnel
As borboletas faziam pó
Mas parecia não ser junho
Era seca verde sem sol.

Numa casa velha na roça
Dona Maria cozinhava
Suas filha lindas rosas
Mas pálidas como fantasmas
Eram cinco lindas toscas
Com sete anos cada.

Uma se chamava Joaquina
As outras iguais a mãe Maria
Maria Conceição, Maria Carminha
Maria Teresa, Maria Luzia
A penúltima era Crismina
A ultima igual a mãe Maria.

O pai sem muita educação
Era um homem de labuta
Seu nome era João
E nessa grande luta
De terra céu e pão
Vivia uma vida de surra.

Uma grande sorte bruta
Era sua vida ingrata
E a natureza com sua fúria
Trousse um tempo que secava
Nas mãos das meninas a cuia...
“Vamos ao açude encher a cabaça.”

Pra piorar a situação
E a luz que já não via
Num domingo de São João
Morri a caçula e linda Maria
Só por causa do patrão
E da comida que não via.

Passado todo o longo drama
Dona Maria e uma vigília
Foram ao cemitério leva rama
Ao tumulo do anjo Maria.
Agora na cidade era fama
Sete crianças mortas por dia.

Era agora fama na cidade
Quem beija em pé de anjo
Fica com muita coragem
Tudo isso embaixo do pano
Pra esconder a verdade
Das milhares de mortes ao ano.

E numa quente segunda-feira
Que nem si via ventania
É encontrado na esteira
O corpo da pobre Crismina.
Oh que vida mais sorrateira
Para a doce mãe Maria.

No natá nossas crianças
Esperam um presente do céu
E dona Maria tem esperança
De nunca mais pô o véu
E como se fosse uma vingança
Lhe rasgam mais um papel.

Na manhã de terça-feira
Luzia não quer comer
Seu João lhe trousse uma pêra
Isso só lhe faz sofrer
Nesta manhã de terça-feira
Luzia decide morrer.

Tão triste e o destino
Daquele flor tão inocente
Por sete dias tocam o sino
Por sete anos um lamento
Pelos fios que são tão finos
De João e Maria o sofrimento.

Em poucas semanas Teresa
Brincando em tanto quintal
Embutida dentro da sexta
Brincando de lobo-mau
Um barbeiro lhe corta a veia
Acabou seu lindo madrigal.

Talvez seus pais chorassem
A perda de sua linda filha
Mas mesmo que a amassem
Sabia de toda a sua sina
E de dentro veio a coragem
Pra tocá a louca vida.

A vida louca foi tocada
Mas o destino ali parou
Carminha flor foi levada
Para bem junto do senhor
A quinta-feira foi sangrada.
Seus pais se rasgam de dor.

“Oh que vida tão doida
Que o mundo me guardou
Resolveu levar minhas filhas
E isso só nos fez a dor
Se ontem eu sorria
Hoje eu sou só pavô.”

“Ô Maria sei que choras
E é muito justo tu chora
Mas lembre-se da aurora
Levante o teu sonhar
Hoje aqui você chora
Amanhã sei tu se alegrará.”

Sei bem que seria bom
Tudo aqui se encerrá
Mas neste triste tom
O sino fez-se ressoá
Era a Conceição que com
A morte hoje partirá.

Nesta noite de sexta-feira
Conceição ali sofreu
Sua vida fico a beira
Do caminho que tremeu
E as lembrança da ribeira
Todas elas as esqueceu.

É a morte de Conceição
Anunciava a preta velha
Com muita dor no coração
Seu pai acendeu a vela
Na luz frente um lampião
Sua mãe se descabela.

“O destino quis assim
De levá a Conceição
Para bem perto de si
Acalmai vossa aflição
Pois é feito para um fim
Esse nosso galardão.”

“Senhor vigário eu lhe digo
Nos resta ainda Joaquina
Que Deus lhe tenha consigo
E lhe ponha a mão divina
O senhor é meu amigo
Reze a luz que lhe ilumina.”

A mais de trezentos anos
Aqui se ergueu uma cruz
E por assim contar os planos
Aqui andou o Bom-Jesus
Acalmou nossos desenganos
Mas cortaram a sua luz.

Dizem o monte é santo
E essa cruz que ilumina
Mas a vida de desenganos
Foi para a pobre mãe Maria
Que como outros planos
Eram sete mortes por dia.

E o final de Joaquina
Foi como de suas irmãs
No sábado de tardezinha
Lembrará sua manhã
‘É a morte de Joaquina!
Acabou o gosto da maçã.

Um João mais uma Maria
Neste sertão de surdos
Sabiam como sofriam
As crianças como mudos.
Sete crianças morriam
Nas regiões de Canudos



Paulo Monteiro - Graduado em Letras - UNEB.

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