Anunciante

terça-feira, 7 de julho de 2020

RESENHA: PSICOLOGIA DO INCONSCIENTE DE CARL G. JUNG

PAULO MONTEIRO DOS SANTOS[1]

 

 

CREDENCIAS DO AUTOR

 

Carl Gustav Jung (1875-1961) nasceu na Suíça, foi um psiquiatra e psicoterapeuta discípulo de Freud, de qual rompeu e depois formulou suas próprias teorias sobre o inconsciente. 

                                                                                    http://obviousmag.org/alfredo_passosbr/2017/os-filmes-influenciados-por-carl-gustav-jung.html

REFERÊNCIA DA OBRA

 

JUNG, C. G. Psicologia do Inconsciente. Tradução de Maria Luiza Appy. Petrópolis, Vozes, 1987.


RESUMO: Psicologia do Inconsciente é a obra em que Jung tenta fazer o que se chamaria de sua teoria geral do Inconsciente. Geral a que se refere aqui, é sua visão não restrita a um tema em específico do inconsciente, mas algo que abrange tudo um esquema, ou uma espécie de mapa conceitual e complementar da teoria freudiana.

 

Na primeira parte, chamada A Psicanálise, Jung descreve a teoria de Freud, como um método no tratamento das neuroses e psicoses. Esse método, como o próprio nome já diz, é analítico. Tal método criado por Freud tinha como principio lançar a base para uma psicologia das neuroses (p.1-2). Mais adiante, Jung, em observações clínicas, chega à constatação, que a maioria dos traumas humanos, de certa maneira, se relacionam com conflitos eróticos em nossa psiquê, e que o amor tem um grande significado na vida do ser humano, mas não apenas o amor. (p.10)

 

Jung intitula a segunda parte de Teoria do Ego. Neste capítulo, retoma sua constatação anterior e começa a analisar que uma neurose é um conflito entre duas potencias no sujeito: a natureza e a cultura. Recorda-se aqui que uma parte deste conflito é erótica. Como então resolvê-lo através da psicanálise? (p.13) O autor aponta que pelo estudo dos sonhos, desenvolvidos por Freud, se foi possível chegar aos verdadeiros problemas das neuroses: “O sonho é a via regia para chegarmos ao inconsciente.” (p.13) Sendo assim, os casos de uma neurose ou mesmo de uma psicose, estão relacionados com o inconsciente, e mais: o inconsciente faz um conflito com o consciente, o qual pede quase sempre que reprima os seus desejos mais profundos. Para Jung, a terapia do sonho é a única forma eficaz no tratamento da neurose. Tais problemas estão intrinsecamente ligados a questão da sexualidade, mas que não é algo anormal, pelo contrário, é super normal, alias um conflito da natureza humana com sua cultura; um conflito do interior (inconsciente) com o meio exterior (consciente). O orgulho que o ser humano tem, às vezes é encarado como algo consciente, e pode-se associar esta consciência como algo bom ou de uma sã psicologia, sobre isso Jung protesta afirmando: “O excesso de animalidade deforma o homem cultural; o excesso de cultura cria animais doentes.” (p.20) Assim, se deve ter muito cuidado ao criar uma idéia de que todo que depende da razão é algo bom, mas se deve, antes de qualquer coisa, perceber e dar um equilíbrio entre a razão cultural com o inconsciente.

 

Na terceira parte, Outro ponto de vista, a vontade de poder, Jung vai expor, como o próprio nome sugere, outra análises sobre os conflitos entre instinto e cultura, que nos seus primórdios, não estão ligados apenas a questões eróticas, como assim afirmava Freud. Como exemplo Jung trás a vida e teoria do filósofo Nietzsche: Este filósofo viveu para além dos seus instintos e da moral cristã, mas tentar romper com tais conflitos lhe custou um preço. A filosofia de Nietzsche revela que no fundo do inconsciente humano, dorme um dragão que busca apenas o poder (p.23). Jung não descarta a questão do Eros freudiano, mas revela em seus primórdios que também o poder que se envolve nas crises neuróticas. O Eros seria apenas uma meta a ser atingido o poder do Eu. O que são as neuroses no fundo? Manobras que o inconsciente utiliza espertamente para atingir seus fins, tão somente vencer (p.32). Com essa teoria de Adler, Jung muda o foco do Eros, o qual Freud não deu a devida importância nos conflitos que surgem no sujeito a partir da disputa do poder.

 

A quarta parte: O problema dos tipos de atitude, o autor vai mais afundo na discussão das teorias de Freud sobre o Eros, e de Adler sobre o poder. Jung aponta que as duas teorias têm razão entre si quando aplicadas ao universo do inconsciente em relação as neuroses. De um lado Adler diz que o sujeito tenta manter sua superioridade sobre o objeto; Freud diz o contrário, que muitas das vezes é o objeto que mais influencia o sujeito. Jung observa que estas duas teorias são diferentes, mas que tem um ponto em comum. Conclui o autor que existem dois tipos de indivíduos: Um que se interessa pelo objeto e outros por si mesmo.[2] Este é o estudo de Jung sobre os dois tipos básicos de comportamento: A Introversão e a Extroversão (p.36). O primeiro com um comportamento mais intimista reflexivo, e o segundo um sujeito mais aberto que não tem medo dos riscos e que se adapta melhor. Dentro desses dois tipos, o neurótico age de forma muito inconsciente, por isso não se sabe, pelo fato de sua neurose, se a pessoa pode ser introvertido ou extrovertido, pois a mesma pode está escondendo sua personalidade. Por isso se diz que o sujeito assume uma dupla personalidade (p.36). Porém, a neurose pode ter seus pontos positivos, diz Jung: “Às vezes ajuda em alguns momentos e nos serve para entendermos que somos humanos, propensos aos erros” (p.36). Jung aponta, partindo do que foi dito antes, que o sujeito não tem controle total de sua energia psicológica, e o inconsciente pode se manifestar como uma energia que se mostra demasiada escapando do controle, tornando-se um transtorno neurótico. Desta maneira, é preciso uma canalização saudável dessa energia, a qual possa unir os dois pólos contrários. Duas pessoas só podem ter equilíbrio quando forem de pólos opostos: introvertido e extrovertido. Mas, sinaliza o autor: pode haver atritos, no entanto há um equilíbrio. “É no oposto que se ascende à chama da vida (p.45)”.

 

Na quinta parte, O inconsciente pessoal e o inconsciente supra pessoal ou coletivo, Jung divide o inconsciente em duas partes: 1) O pessoal, que diz respeito aos traumas e lembranças infantis, paixões da alma, etc; 2) O inconsciente coletivo, o qual tem uma espécie de reminiscência primordial, baseado em um passado que não é do próprio sujeito, mas sócio-cultural. Adverte-se aqui que esta memória coletiva é inconsciente. Explica-se: Esse inconsciente coletivo se liga ao mitológico: O inconsciente cria fantasias mágicas sobre uma situação: visões de fantasmas; manifestações transcendentes etc. mas tudo isso se deve apenas a esse tipo de inconsciente “onde jazem adormecidas as imagens universais (p.57)”. Jung, para provar sua teoria, diz que é como surgem nas teorias antropológicas dos mitos suas semelhanças e suas relações, graças a esse inconsciente coletivo: Hércules (mito grego), Sanção (mito hebraico) seria um exemplo de comparação.

 

No plano relacionado à questão da neurose, não só desta, mas as influencias que esta divisão do inconsciente (coletivo e pessoal) provoca no ser humano, põe em evidencia, no sujeito, uma luta de contrários: 1) período da juventude; 2) período da maturidade. O da juventude se caracteriza por uma fase natural: ter filhos, trabalhar, casar, (instintivo de procriação); A fase da maturidade é mais cultural, onde o sujeito precisa conservar valores. Jung defende que as neuroses sempre acontecem nesta fase da maturação, pois muitas pessoas em tal período querem manter-se jovens e se agarram a um momento estagnado da sua mocidade. Surgem assim uma crise de contrários, pois o inconsciente tenta voltar a uma vida passada e ao mesmo tempo reprimi-la. Nesse tempo é que começa um período de radicalização, conversões religiosas, rompantes amorosos, alcoolismo etc. Antes os ídolos eram outros, agora surgem novos, ou mesmo precisa-se mantê-los. Porém é preciso haver essa oposição interior de contrários no ser humano porque é ela quem garante a energia no sujeito. “Tudo que é humano é relativo (p.67)”, diz Jung, em uma relação de contrários. “Tudo isso significa ruptura e conflito consigo mesmo (p.68)”.

 

Neste capitulo, Jung fala também sobre sua teoria dos Arquétipos. Quando se regressa as recordações infantis e depois se avança para as pré-infantis, o sujeito se depara com o seu inconsciente coletivo, o qual são lembranças não vividas pelo individuo, mas que lhe serve como modelo, por isso Jung aponta-os como arquétipos. São memórias culturais que fomos introduzindo em nosso inconsciente e encarnando em nosso modo de ser e viver. Pode surgir como uma fase espiritual no sujeito, ou menos nos sonhos. Importante dizer que tudo se da de maneira inconsciente. (p.69).

 

Na sexta parte, O método sintético ou construtivo, Jung expõe o método que utilizou em suas pesquisas sobre o inconsciente. Claramente o método é o sintético, o qual decompõe as partes, estudando-as separadamente, para depois reuni-las numa ideia geral. Porém tal ideia não descarta a forma analítica. Explica-se: Apenas em um método de análise, pode se ocorrer o risco de não levar em consideração a experiência do paciente. Tão somente uma análise do sonho não é suficiente para chegar à raiz dos problemas neuróticos. Por essa razão, Jung leva em consideração não só o sonho do sujeito, mas também seu passado, infância e sua cultura. E o paciente precisa, por ele mesmo, se auto conhecer. Jung acredita que o método analítico, limita ao terapeuta a somente uma leitura do problema, por isso é importante decompor as partes em uma análise construtiva entre paciente e terapeuta. Não é correto fazer um diagnóstico com uma análise apenas do sonho, é preciso conhecer também a parte consciente do sujeito, e desta, fazer uma integração com o seu eu profundo.

 

A sétima parte, Teoria dos arquétipos do inconsciente coletivo, um dos capítulos mais significativos da obra, aborda com mais afinco a teoria sobre os arquétipos. O que são anjos, demônios, deuses? Será que tais seres existem? Para Jung, a maioria dos homens atuais diria que não. As pessoas antes do apogeu do Iluminismo e do racionalismo, na Europa da Idade Média, acreditavam no demônio, deuses e anjos, mas Jung aponta que tais fatos são arquétipos de nosso inconsciente coletivo, que foram sendo acrescentados por meio de uma cultura passada de geração em geração pela cultura. Quando houve a ascensão do racionalismo, não teve mais espaço para os arquétipos no inconsciente, porém não foi isso que a história mostrou. Jung sugere que estes arquétipos eram nossa irracionalidade a qual foi suprimida por um racionalismo moderno. Pela experiência da psicanálise, tudo o que é reprimido volta como neurose, assim esse irracionalismo voltou e causou as grandes guerras e as revoluções. Guerras irracionais, mas que foram justificadas por uma razão dominante. O autor diz que se pode concluir todo esse desequilíbrio na humanidade como uma neurose coletiva da repressão dos arquétipos. (p.81-103).

 

Na oitava parte, A interpretação do inconsciente: noções gerais da terapia, o autor salienta que o inconsciente não pode ser tratado como algo inofensivo, ou como um brinquedo, é preciso estar atento para as neuroses que o inconsciente pode apresenta, pois tais casos, quando não tratados, podem evoluir para uma psicose. Até mesmo pessoas que se julgam racionais, e não terem neuroses, podem estar guardando uma psicose latente, oculta (p.104). Assim, também um tratamento mal feito por parte do psicólogo pode afetar alguém ou mesmo o profissional da área.

 

Jung diz que um dos perigos do inconsciente, em ralação as neuroses, são as questões dos acidentes, sejam domésticos, automobilísticos, etc. Às vezes o inconsciente já vem planejando esses acidentes meses antes, ou mesmo anos: “Examinei grande número de casos dessa ordem, e pude comprovar que muitas vezes, semanas antes, os sonhos já revelaram uma tendência autodestrutiva. (p.105).” Mas não se deve com isso, protesta Jung, apenas olhar a parte negativa do inconsciente. Este, por sua vez, tem todo o acumulo de uma conhecimento coletivo, conhecimento que pode beneficiar o consciente em seu transcender e sublimação. O que se pode fazer é uma integração entre inconsciente e consciente na ajuda ao sujeito de tratar sua neurose ou psicose.

 

Concluindo, Jung fala que o tratamento terapêutico pode ser descrito como algo muito difícil de ser feito na práxis, o que não parece quando é descrito em trabalhos acadêmicos, mas se faz em um processo delicado. O tratamento da neurose pode ajudar alguém de forma rápida, ou de forma lenta, dependendo do sujeito. “No fundo, tudo é experiência nessa psicologia. (p.107).”

 

INDICAÇÃO DA OBRA

Este texto é indicado para pessoas que trabalham e estudam na área da Psicologia, Pedagogia e mesmo para um público que procura conhecer melhor as teorias em torno do seu inconsciente.     

 

 



[1] Graduado em Letras (UNEB) e Filosofia (FAVI)

Email: paulus.monterum@gmail.com

[2] Depois desta crítica de Jung, Freud escreveu a obra Introdução ao Narcisimo, e nesta obra Freud faz um estudo geral sobre estas duas tendências.


Nenhum comentário:

Postar um comentário