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quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

ARTIGO: A ONTOLOGIA EXISTENCIALISTA SERTANEJA NA OBRA OS SERTÕES DE EUCLIDES DA CUNHA

PAULO MONTEIRO DOS SANTOS[1]


INTRODUÇÃO

 

Este trabalho toma por tema a ontologia como estudo no livro Os Sertões de Euclides da Cunha. Para isso se baseia na teoria de três grandes filósofos: Hegel, Heidegger e Sartre. Para melhor nos orientar, abordaremos nosso argumento em dois tópicos: primeiro é o significado do termo sertão e sua implicação linguística neste trabalho; segundo, o nascimento conflitante do sertanejo. Logo abaixo, traremos nesta introdução hipóteses gerais sobre esses dois tópicos, os quais serão expostos mais amplamente nos capítulos.

O termo sertão tem um significado muito peculiar. Embora não seja especificamente definitivo, sertão é aquela terra inóspita, desconhecida, perigosa, onde seria melhor evitar a passagem (HOLANDA, 2001, p. 633). No entanto, para os antigos bandeirantes, era no sertão onde se encontrava as preciosidades como ouro, prata e pedras preciosas. A formação morfológica da palavra que nos chega desde os tempos coloniais é esta, sertão. Palavra que foi popularizada por Euclides da Cunha e que é o título basilar de sua obra-prima Os Sertões. Para nós, o título dado pelo autor não foi por acaso como um recurso literário, mas há um significado mais profundo e originalmente filosófico, e aqui vamos expor nossa interpretação: sertão é o ser em sua forma mais obscura e ao mesmo tempo encantadora que abrange tanto os indivíduos quanto a terra, assim dividimos a palavra em “ser-tão”. Nos parece que Euclides da Cunha captou no termo, embora não exponha em sua obra, uma direção ontológica da formação de uma espécie de sujeito atravessado pelo ser, o ser-tanejo. Sobre este termo trataremos em uma ontologia existencialista sertaneja.

Dessa formação nasce também o ponto conflitante dos três povos que ocuparam a nova terra (Brasil), conflito que tem como palco o seio do ser-tão, Canudos. Desta luta o ser-tanejo vai assumir aquilo que o indivíduo é em seu ser, o que Heidegger chamou de ôntico-ontológico. Mas esta percepção não se deu a todos os envolvidos na luta, mas apenas ao ser-tanejo. O que queremos dizer é que Euclides da Cunha, já muito antes, antecipa uma ontologia existencial com sua obra. Assim, no livro temos uma lógica dialética a qual o autor se inspira, e iste é um fato, em Hegel (CUNHA, 2002, p.62). Notamos que a obra se inspira na divisão hegeliana: Terra (tese); Homem (antítese) e Luta (síntese). Porém, em nenhum momento essa nossa teoria é dita pelo autor, o qual dedica a Hegel um tópico e sem entrar em detalhes sobre sua filosofia dialética. A questão vai se revelando tão profunda que é possível notar as teorias de Heidegger e Sartre, sobre o ser, o qual já denominamos pela língua portuguesa de ser-tanejo (HOLANDA, 2001, p.632).

Os tópicos que irão se seguir pretendem explorar na obra Os Sertões uma ontologia nascente do ser-tão e do ser-tanejo, a luz de uma dialética do ser. No primeiro capítulo vamos conceituar a palavra ser-tão como o ser de maneira geral, e no segundo capítulo o ser-tanejo como aquele que captou o sentido do ser. De antemão, já afirmamos os autores bases em nossa análise que são eles, Hegel, Heidegger e Sartre. Tais filósofos serão de notável ajuda na compreensão desses dois seres: ser-tão e ser-tanejo.

 

1 SER-TÃO: UM SENTIDO DO SER

 

Sertão não é algo, já que não tem uma materialidade em si mesma, mas é um conjunto de algo. É um local sem determinação exata, sendo assim uma totalidade, um universal. O homem do Sertão, sertanejo, é ele mesmo o sertão, pois vive nele junto com os outros e as outras coisas que compõem esse local que por sua vez é inóspito, perigoso, belo e encantador. No Nordeste do Brasil, o sertão é a caatinga, o qual tem por princípio um deserto total nos tempos de estiagem, mas um oásis nos tempos chuvosos. Situação que sempre trás ao nordestino um ponto de partida que é a angústia do homem na natureza. Assim visto, o sertão no contexto da caatinga, assume uma simbioses com o sujeito que fica, desta forma, à mercê da terra, amparado por ela, exigindo desta uma condição.

Para Euclides (2002, p. 19 e 73), Terra e Homem estão casados em um contexto, embora haja uma luta entre estes. Desta forma, pensamos que Euclides notou o exemplo que salientamos antes, em um ponto altamente filosófico que foi a dialética entre a Terra, o Homem, e a Luta. Essa dialética é a mesma de Hegel (CUNHA, 2002, p.62), mas há muita diferença entre os autores. Euclides se dedica em sua obra Os Sertões com a questão da natureza, nisto, acreditamos que para o escritor, não existe, como em Hegel, uma razão absoluta regendo as coisas (NÓBREGA, 2011, p. 59). Em Euclides, é a própria natureza o conceito central, tanto assim o é que a primeira tese é a da Terra. Esta, engloba o todo: homem e a luta. Sendo o ser por excelência a terra, que vai delimitar o contexto, ou seja, não é a terra quem se adequa ao homem, mas o contrário. A maior luta do homem não é entre os homens, mas entre o homem e a terra (CUNHA, 2002, p.71). Euclides reconhece, assim como em Hegel , o homem, (antítese), como sendo essa liberdade, pois reage sobre a terra, buscando se adaptar, essa figura é a do beato Antônio Conselheiro “[...] que o próprio excesso de subjetivismo predispusera à revolta contra a ordem natural, como que observou a fórmula do próprio delírio” (CUNHA, 2002, p.145). Embora as palavras tomem Antônio Conselheiro pejorativamente como um deficiente mental, é clara no que diz: “a revolta contra a ordem natural”, essa observação só comprova nossa tese de que é Antônio Conselheiro o homem movido pela sua guerra contra o sofrimento da terra. Para Euclides, e assim acreditamos, a força do exército republicano, movido pela força determinista de seu tempo, é oposta ao espírito libertador de Antônio. O exército (raça civilizatória) é a manifestação da própria terra como “ordem natural”, já que esta é a raça forte por natureza, enquanto o homem do norte, ser a raça fraca. (CUNHA, 2002, p.112 e 113). No entanto, a obra de Euclides, mesmo não querendo fugir a sua teoria determinista, assume um ponto crítico, e esse ponto é o que fundamenta nossa tese de uma ontologia existencialista sertaneja.

 

“Canudos não se rendeu. Exemplo único em toda a história, resistiu até o esgotamento completo. Expugnado palmo a palmo, na precisão integral do termo, caiu no dia cinco, ao entardecer, quando caíram os seus últimos defensores, que todos morreram. Eram quatro apenas: um velho, dois homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente cinco mil soldados” (CUNHA, 2002, p.532).

 

As palavras acima citadas, são fortes e assim assumem o ponto existencial, por seu tom angustiante. Não apenas Antônio Conselheiro alcançou essa liberdade existencial, mas também seus seguidores, pois não renunciaram a sua liberdade a não se render. Ora, Canudos percebeu que aquilo era o sertão. Por mais que não se possa mudar a terra, “ordem natural”, se pode tentar. O sertanejo percebe assim o sentido do ser, como diz Heidegger, o ôntico-ontológico, pois este se questionou e não permaneceu como os republicanos na área que Heidegger chama de pré-ontológica. Ambos são Dasein, uma possibilidade de… (HEIDEGGER, 2005, p. 42 e 43), mas somente o sertanejo está no questionamento do ser. Com esta análise podemos até criar nossa denominação a esse Dasein como “Ser-tanejo”. A própria estrutura morfológica aponta nossa tese. Este ser-tanejo, vem de outro ser, ser-tão. Embora a terra me obrigue a lutar contra ela, não pretendo mudá-la, mas me adaptar. O ser-tanejo  é um ser vasto como a terra. Assim, ao mesmo tempo que a terra é inóspita, o ser-tanejo se aproveita desta situação para sua proteção contra os inimigos, usando a terra a seu favor. O ser-tanejo é um ser, que ao mesmo tempo separado (transcendência), se faz um ente, junto a natureza, ser-tão.

Na obra de Euclides, o que fica evidente é o ser-tanejo como a realidade humana que percebe o ser, ou seja, a abertura do ser que se questionou sobre sua existência. Euclides da Cunha, por coincidência, não classifica os outros sujeitos, contra os conselheiristas, como ser-tanejos, ao contrário, chama de republicanos, e se sabe que os republicanos eram em sua maioria positivistas. O ser-tanejo se quer é chamado de monarquistas, pois por sua falta de instrução, sequer sabe ao certo o significado de um regime monárquico. Mas sabe, este ser, que ele é um ser, uma liberdade, como diz Sartre (SARTRE, 1997, p. 102). Assim percebe sua existência factual no mundo. Pode não ser um sujeito instruído nas ciências positivistas, mas é o ontico-ontológico, ou este ser-para-si invadido pela náusea. No corrente, foi convidado por sua transcendência a tomar partido. Esse partido se revela ao ser-tanejo como uma transcendência religiosa, mas esta é uma transcendência na imanência: o paraíso dito na Bíblia não é no transcendente, mas logo ali em Canudos, lugar bem real. Logicamente que essa abertura ao ser não agradou às instituições vigentes, nem mesmo a igreja que era o poder divino encarnado, e que o ser-tanejo desafiou. Sapere Aude ( KANT, 1985, p. 100 ), bradou o ser-tanejo.

Todas estas questões do conflito dos ser-tanejo com a terra e do conflito contra os republicanos, acreditamos revelar-se um ponto importante na obra de Euclides: A terra passa a ter uma espécie de consciência, não aquela ideia de res cogitans cartesiana como consciência racional, mas uma consciência dialética entre ser-tanejo e ser-tão (natureza) e sua síntese que seria a luta. Esse ponto de vista assume uma forma de união entre a filosofia de Hegel a outra mais antiga, que acreditamos ser inspirada na filosofia indigina, onde o homem está submetido à natureza. Tanto assim o é que a luta não é ditada por homens, mas por uma espécie de condição das raças. Estes termos só fortalecem nossa tese: raça inferior contra raça superior. Tais termos se aplicam na questão de uma seleção natural, dito de outra maneira, é a natureza quem define as regras.

As ideias de Euclides da Cunha, que era um homem de ciências geológicas, no livro os Sertões, são altamente deterministas. No avançar da obra, vamos notando por menores, por exemplo: o ser-tão não se abrange a todo o território brasileiro, apenas ao interior, muito menos o ser-tanejo poderia ser dito como todo brasileiro. O ser-tões são locais longe das áreas que Euclides chama de civilizadas; são as terras ignotas (CUNHA, 2002, p. 27), áreas marcadas por longos períodos de desertificação, exigindo muito mais do indivíduo, formando na estrutura deste um verdadeiro martírio, ou seja, o martírio secular da terra (CUNHA, 2002, p. 70 e 71). Assim, nasce esse "homem", que não é qualquer indivíduo, mas o ser-tanejo. Lembrando, que não é Euclides que cria o termo, mas apenas evidencia esse fato. Para finalizar, com base no que esboçamos acima, podemos dizer que não é o ser-tanejo que se faz ser-tanejo, mas o ser-tão, que lhe abre o ser, e essa abertura se dá pelo martírio, que funciona como uma angústia existencialista.

 

2 O NASCIMENTO DO SER-TANEJO

 

O que dissemos antes foi uma forma morfológica da palavra sertão, a qual sugerimos com relação ontológica ao termo ser, fim este que coincidiu com a própria divisão da palavra, ser-tão e ser-tanejo. Mas esta divisão não foi apenas a sua forma morfológica no afixo "ser", o próprio prefixo se revelou uma teoria existencial do indivíduo que reside naquela ( e aqui tomamos como termo de totalidade na própria unidade) terra chamada ser-tão, como totalidade; e ser-tanejo, como unidade. O ser-tão é a facticidade e o ser-tanejo é aquele que percebeu o sentido do ser dentro desta facticidade.

Está evidente que nossa teoria se finca nas ideias filosóficas de Heidegger e Sartre. De Heidegger, pois este dasein (ser-tanejo), percebeu essa existência pelo martírio da terra, a qual é a angústia do ser. Seguindo Heidegger, a percepção não se deu de um cogito do tipo cartesiano, consciência racional científica, mas sim de uma origem na transcendência que é este ser. Em Sartre, essa angústia o força tomar partido e lutar para salvaguardar sua liberdade, porque esse ser-tanejo (ser-para-si) é ele também liberdade. Neste capítulo vamos seguir a análise destes dois autores, Heidegger, Sartre, mas também seguindo as idéias dialéticas de Hegel, pois são elas que acreditamos nortear a obra em questão de Euclides da Cunha. Euclides, e essa é nossa opinião, colocou em sua obra uma mescla de ontologia, que ele buscou em Hegel, só que notou o existencialismo partindo dos indivíduos de Canudos, mesmo que nem sequer fez uma citação a Sartre ou Heidegger. E nem poderia Euclides citá-los em seu livro, pois Os Sertões foi lançado em 1905.

Aqui começamos pela questão dialética de Hegel. Como salientamos antes, a obra de Euclides segue a ordem da filosofia hegeliana: A terra é o ser de maneira geral, mas essa terra que afirma o autor é a natureza, então o indivíduo (ser-tanejo), não se encontra fora dela, muito menos tem um mundo aparte dela, ao contrário, está mesclado nela. Por isso, Euclides fala de raça superior, as quais são oriundas da terra. A natureza é o ser por excelência e os outros seres são submetidos a ela que seleciona e aparta. Essa natureza pode ser dadivosa, porém no sertão não o fez assim, que segundo Euclides, não fixou o homem. Este sujeito não é qualquer indivíduo, mas o ser-tanejo (CUNHA, 2002, p. 62). Por mais que a terra acolha o ser-tanejo, suas nuances de estiagem criam um jogo dialético, um “jogo de antiteses”, afirma o próprio Euclides (2002, p. 63). Mas nesta dialética, o ser-tanejo não sente uma repulsa por parte da natureza, mas como sendo ele mesmo acolhido pelo ser-tão, pois é ele mesmo esse ser-tão, forte e difícil de ser definido. “ O sertanejo é, antes de tudo, um forte” (CUNHA, 2002, p. 115)

  Euclides (2002, p. 28) salienta que as pessoas daquela região (ser-tão), nascidas neste contexto, não permanecem, mas saem para outras cidades: “Nenhuma se fixou lá” (CUNHA, 2002, p. 28). O ser-tanejo, ao contrário, não migrou, no entanto, parte para dentro do seio do ser-tão, se adaptando. Vejamos algumas questões radicais nesta percepção: 1) Estes ser-tanejos são os conselheiristas que acreditam no projeto do Conselheiro, ou seja, não são qualquer indivíduo; 2) Este ser-tanejo não está atrás de ouro nem prata, ou riquezas da terra, mas seu projeto é totalmente político, assim não são bandeirantes, ou os sertanistas, que apenas desbravaram, no entanto não se fixaram; 3) O ser-tanejo foi afetado por uma angústia, mas que não lhe leva a recusar o ser-tão, mas ser com ele, e Euclides interpretou essa angustia como loucura no ascetismo do Conselheiro (CUNHA, 2002, p. 158), nós entendemos como uma abertura existencial.

Assim, interpretamos que a linha do ser atravessou aqueles sujeitos, especificamente ser-tanejos, algo como uma certa sabedoria, a qual Sartre, chamou de cogito pré-reflexivo (SARTRE, 2020, p. 24), já que, pensou o ser-tanejo: é possível viver neste lugar seco e deserto, pois a vida é essa luta dialética que pode ser transformada  a nosso favor. Tanto foi desta maneira que Canudos cresceu mais que as outras cidades, tornando-se uma ameaça econômica (CUNHA, 2002, p. 172), assustando todas as instituições. Até mesmo a instituição que influenciava ideológicamente suas concepções religiosas que era a igreja Católica, e este rompimento não foi algo simples, pois representou uma abandono crítico a um poder tão importante culturalmente na vida daqueles sujeitos. Os ser-tanejos não reconheciam a doutrina da igreja Católica, isso o prova Euclides (2002, p.196): “V. Rvma. é que tem uma falsa doutrina e não o nosso conselheiro.” Essa passagem se deu quando missionários católicos foram a Canudos e houve discussões acerca de como Conselheiro conduzia religiosamente seu povo. A Igreja queria que os ser-tanejos reconhecessem a república e voltassem a aceitar as cobranças feita pelo governo, fatos que foram recusados pelos conselheiristas (ser-tanejos) até às últimas consequências.

O ser-tanejo encontrou um novo sentido para o ser-tão, até então não percebido, que foi o de não fugir. Como afirma Sartre, esse para-si, ser-tanejo, percebeu sua existência, uma abertura no seio da consciência: não somos uma coisa em-si mesma, fechada e que se dissolve em uma identidade, mas uma consciência que só pode ser sendo consciência de alguma coisa e não a coisa em si, ou seja, não precisamos que alguém nos trate como marionetes,  simples objetos. Sobre este pensamento o ser-tanejo se engaja na luta e toma partido. Mas o que faz com que o ser-tanejo perceba essa abertura, não é a metafísica do nada, sartreano, mas a metafísica da religião na figura do asceta Antônio Conselheiro. E sua ascese o levou ao martírio, o deserto de si. Assim, como a náusea em Sartre, o martírio não tem por sentido o sofrimento para o ser-tanejo, pois se assim fosse não teria sentido lutar, de outra forma seria aceitar os desígnios de Deus. Ao contrário, o ser-tanejo desafiou, como vimos antes, todos os poderes. Ora, esse martírio não pode ser para o mal do ser-tanejo, e tal ideia está clara no Sertões, embora pareça absurda. Tanto assim é que Antônio Conselheiro é visto com espanto: louco, profeta, político. As autoridades não sabiam defini-lo, chamando-o de subversivo e pregando doutrinas contra o Estado e a religião (CUNHA, 2002, p. 166). A pergunta que podemos formular é: se o martírio deve nos condicionar a aceitar a realidade, porque o ser-tanejo, mesmo passando por esse martírio ascético no deserto (ser-tão) não aceitou?

O martírio para o ser-tanejo, assumiu, pensamos, o que diz Heidegger como uma abertura ao ser, um sentido do ser, desta abertura uma percepção da liberdade. O ser-tanjo não se percebeu como esta cadeira, esta mesa, mas como Dasein, no portugues ser-aí, mas nossa nomenclatura ousamos dizer ser-tanejo. desta forma o ser-tanejo não é apenas um ôntico, mas um ôntico-ontológico a sua maneira, pois a maioria dos que em Canudos viviam, mal sabiam ler ou escrever, muitos menos eram versados em filosofia ou qualquer ciência. Mas Euclides é explícito em dizer que o ser-tanejo não aceitou sua condição, assim como os republicanos aceitaram, ou mesmo os que moravam ali. O oposto, o ser-tanejo não quer sair do ser-tão, fazendo um papel inverso. Para finalizar, o martírio se revelou como o sentido de que a vida do sujeitou é uma luta dialética entre o “Homem” (ser-tanejo) e a “Terra” (natureza). Mas não é o martírio uma aceitação de condições subserviente e assujeitamento nem a terra nem a ser escravo. Para o ser-tanejo o martírio nos conduz a liberdade pois nos revela nossa existência.


CONCLUSÃO

 

Vimos no primeiro capítulo como o significado da dialética assumida pelo ser-tanejo diante da natureza,  não é um ser fora da natureza, por isso não deve lutar para eliminar sua condição de ser com a terra, mas lutar para se adaptar, pois o ser-tanejo é ele mesmo o ser-tão. Já no segundo capítulo explicamos como é essa dialética e sua formação, a qual é a abertura e o sentido do ser formando assim o ser-tanejo. Essa abertura só foi possível ao ser-tanejo pelo martírio da terra, o qual não o condiciona em se resignar, mas o convida à luta. Luta esta que é a suprassunção de sua existência.

 

REFERÊNCIAS

 

CUNHA, Euclides. Os Sertões. São Paulo: Martin Claret, 2002.

 

HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Tradução de Maria de Sá Cavalcante. 10. ed. Petrópolis, RJ: Vozes; Bragança Paulista, SP: Editora Universitária São Francisco, 2015.

 

KANT, Immanuel. Textos seletos. Tradução Raimundo Vier; Floriano de Souza Fernandes; Emmanuel Carneiro Leão.  2. ed. Petrópolis, RJ: 1985.

 

NÓBREGA, Francisco Pereira. Compreender Hegel. 6. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

 

SARTRE, Jean-Paul. O Ser e o Nada: Ensaio de ontologia fenomenológica. Tradução de Paulo Perdigão. 24. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2020.


[1] Especializando do curso de Filosofia Contemporânea - UEFS (Universidade Estadual de Feira de Santana). E-mail: paulus.monterum@gmail.com

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